Belli, nestas estâncias
predicatórias ao robô sublunar – com versos sem rimas, embora metrificados
alternadamente com seis e dez sílabas poéticas –, esmera-se em dar curso, em determinadas
linhas, a construções hiperbáticas, como se tencionasse deslocar o leitor de
sua zona de conforto cognitiva.
Mantendo o arranjo sintático
da redação original, verti o poema ao português sem tornar direto o discurso,
para que o internauta perceba o quanto a ordem em que dispostas as palavras suscita
perplexidades em nossas mentes, demandando maior esforço de assimilação, quase
como se desconhecêssemos as formas de construção verbal assemelhadas dos dois
idiomas.
J.A.R. – H.C.
Carlos Germán Belli
(n. 1927)
Robot sublunar
¡Oh robot sublunar!
por entre cuya
fúlgida cabeza
la diosa Cibernética
el pleno abecé humano
puso oculto,
cual indeleble sello,
en las craneales
arcas para siempre;
envídiolo yo cuánto
porque en el escolar
malsano cepo
por suerte se vio
nunca
un buen rato de su
florida edad,
ni su cráneo fue
polvo
en los morteros de la
ilustración;
que tal robot dichoso
las gordas letras
persiguió jamás,
y antes bien
engranaron
en las dentadas
ruedas de su testa,
no más al concebirlo
el óvulo fabril de la
mecánica;
y más lo envidio yo,
porque a sí mismo
bástase seguro,
y ágil cual
deportista,
de acá para acullá
expedito vive,
sin el sanguíneo riego
del ayer, hoy, mañana
ineludible.
Robô pintando um
autorretrato
(Johan Scherft:
artista holandês)
Robô sublunar
Ó robô sublunar!
por entre cuja fúlgida cabeça
a deusa Cibernética
o completo alfabeto humano pôs oculto,
qual indelével selo,
nas cranianas calotas para sempre;
invejo-o eu quanto
porque no escolar malsão cepo
por sorte se viu nunca
um bom lapso de sua florida idade,
nem seu crânio foi pólvora
nos morteiros da ilustração;
que tal robô ditoso
as gordas letras perseguiu jamais,
longe disso, engrenaram
nas dentadas rodas de sua testa,
não mais ao concebê-lo
o óvulo fabril da mecânica;
e mais o invejo eu,
porque a si mesmo basta-se seguro,
e ágil qual desportista,
daqui para ali expedito vive,
sem a sanguínea irrigação
do ontem, do hoje, do amanhã ineludível.
Nota:
A seguir, rápidas paráfrases das estrofes do poema, com o objetivo de
tornar mais imediata a assimilação do quanto por meio delas se exprime:
I. Ó robô sublunar, em cuja cabeça brilhante a deusa Cibernética ocultou
para sempre o alfabeto humano completo, como um selo inapagável, em suas
calotas cranianas.
II. Quanto eu o invejo, porque, na mórbida clausura escolar, por sorte
nunca se o viu na flor da idade por um bom lapso de tempo, tampouco se
testemunhou o seu crânio virar pólvora nos morteiros da ilustração.
III. As gordas letras jamais foram perseguidas por tal robô ditoso, longe
disso, ao deixarem de concebê-lo como o óvulo fabril da mecânica, acabaram elas
por se engrenar nas rodas dentadas de sua testa.
IV. E mais ainda eu o invejo, porque é seguro de si e ágil como um
atleta, movendo-se com iniciativa daqui para ali, sem a irrigação sanguínea do
ontem, do hoje, do inevitável amanhã.
Referência:
BELLI, Carlos Germán.
Robot sublunar. In: AA.VV. Carlos Germán Belli: un punto incandescente.
1. ed. dig. Lima, PE: Vallejo & Co., set. 2021. p 207.
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