Ao ler este poema de Johnston,
pareceu-me que as nomeadas abelhas em pauta são menos os insetos produtores de
mel do que quaisquer outras figuras que poderiam se lhes associar como
metáforas, para caracterizar um turbilhão de ideias na mente do poeta, quando
em frente à máquina de escrever, no momento mesmo em que os poemas são
lapidados em palavras sobre a folha em branco.
Com efeito, a linha de
arguição de Johnston aparenta contrapor a denominada “poesia
de ideias” a uma outra abordagem – da qual o autor australiano seria bem
mais afeito – descritiva, imagética, visualizável por conjectura, à maneira dos
versos de um William Carlos Williams, ou mesmo contraposta à pura abstração
pensante, apta a levar o poema até as regiões lindeiras, v.g., da filosofia ou
do ensaio especulativo.
J.A.R. – H.C.
Martin Johnston
(1947-1990)
The typewriter
considered as a bee-trap
The typewriter
considered as a bee-trap
is no doubt less than
perfectly adapted
to its function, just
as a bee-trap,
if there are such
things, would hardly be the ideal contrivance
for the writing of
semi-aleatory poems about
bee-traps and
typewriters. Why, in any case,
you are entitled to
ask, should I
want to trap bees at
all? What do with them
if caught? But there
are times, like today,
when bees hover about
the typewriter
more frequently than
poems, surely knowing best
what best attracts
them. And certainly at such times,
considered in terms
of function and structure,
the contraption could
be argued to be
anything but a
typewriter,
the term “anything”
being considered
as including, among
all else, bee-traps,
softly multiplying in
an ideal world.
Máquina de Escrever
& Abelhas
(Autoria
desconhecida)
A máquina de escrever
considerada como uma armadilha para abelhas
A máquina de escrever,
considerada como uma armadilha para abelhas,
mostra-se, sem
dúvida, menos que perfeitamente adaptada
à sua função, tão
apenas como uma armadilha para abelhas,
se existem coisas da
espécie; dificilmente seria a engenhoca ideal
para a escrita de
poemas semialeatórios sobre
armadilhas para
abelhas e máquinas de escrever. Por que, em todo caso,
você teria o direito
a me perguntar se eu haveria
de querer capturar
abelhas? O que fazer com elas
se as apanho? Mas há
momentos, como hoje,
em que as abelhas
revoam sobre a máquina de escrever
com mais frequência
do que os poemas, seguramente sabendo
melhor o que mais as
atrai. E certamente nessas ocasiões,
apreendida em termos
de função e de estrutura,
se poderia argumentar
que a engenhoca seria
qualquer coisa menos
uma máquina de escrever,
o termo “qualquer
coisa” sendo interpretado
como a incluir, entre
tudo o mais, armadilhas para abelhas,
multiplicando-se
suavemente em um mundo ideal.
Referência:
JOHNSTON, Martin. The
typewriter considered as a bee-trap. In: LEHMANN, Geoffrey; GRAY, Robert
(Eds.). Australian poetry since 1788. Sydney, AU: University of New
South Wales Press (UNSW Press), 2011. p. 768.
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