Os versos deste poema
narrativo nos contam sobre as desventuras laborais de um tio do falante chamado
“Sol”, para quem tudo quanto empreendeu em vida veio a expirar (entenda-se, não
exatamente por sua própria vontade), mas não a rigor quando morreu, pois, aí sim,
deu ensejo a uma multiplicação interminável de vermes, tornando-se um
sustentáculo para a reprodução da vida – como um verdadeiro “Sol” haveria de
ser!
De um perdedor
espontâneo a um vencedor involuntário: assim se poderia resenhar o histórico de
existência do tio “Sol”, homem que, diante dos seus fracassos, abre mão da
própria vida se afogando num tanque d’água, dando cabo à luz e ao calor – um
atributo mais formalmente condizente com o seu respectivo nome – para se
converter, com o seu corpo inerte, num negócio de êxito.
J.A.R. – H.C.
E. E. Cummings
(1894-1962)
nobody loses all the
time
nobody loses all the
time
i had an uncle named
Sol who was a born
failure and
nearly everybody said
he should have gone
into vaudeville
perhaps because my Uncle Sol could
sing McCann He Was A
Diver on Xmas Eve like Hell
Itself which
may or may not
account for the fact that my Uncle
Sol indulged in that
possibly most inexcusable
of all to use a
highfalootin phrase
luxuries that is or
to
wit farming and be
it needlessly
added
my Uncle Sol’s farm
failed because the
chickens
ate the vegetables so
my Uncle Sol had a
chicken farm till the
skunks ate the
chickens when
my Uncle Sol
had a skunk farm but
the skunks caught
cold and
died and so
my Uncle Sol imitated
the
skunks in a subtle
manner
or by drowning
himself in the watertank
but somebody who’d
given my Uncle Sol a Victor
Victrola and records
while he lived presented to
him upon the
auspicious occasion of his decease a
scruptious not to
mention splendiferous funeral with
tall boys in black
gloves and flowers and everything and
i remember we all
cried like the Missouri
when my Uncle Sol’s
coffin lurched because
somebody pressed a
button
(and down went
my Uncle
Sol
and started a worm
farm)
Homem alimentando
galinha
(Joe Smigielski:
pintor norte-americano)
ninguém perde o tempo
todo
ninguém perde o tempo
todo
eu tive um tio
chamado
Sol que já nasceu
falido e
quase todos disseram
deve ter
acabado num
vaudeville talvez porque meu Tio Sol
cantava McCann Era
Mergulhador no Natal
como o Próprio Demo
conta ou não pelo
fato de meu Tio
Sol ceder
possivelmente a mais imperdoável
de todas para usar
frase faustosa
as luxúrias que são
digo
é o sítio e que seja
inutilmente
dito
O sítio do Tio Sol
faliu porque as
galinhas
comeram a horta então
meu Tio Sol teve uma
granja e os gambás
comeram as galinhas e
meu Tio Sol
foi criar gambás mas
eles se resfriaram e
morreram e
meu Tio Sol imitou os
gambás na sutileza
ou se afogou no
tanque d’água
mas alguém dera ao
meu Tio Sol uma Vitrola
Victor e discos de
presente enquanto vivo
na hora propícia de
seu falecimento proporcionou
um grandioso pra não
dizer esplendoroso funeral
com moços altos luvas
pretas flores e tudo e
eu lembro nós todos
choramos um Missouri
quando baixou o
caixão do Tio Sol por-
que alguém apertou um
botão
(e foi-se
meu Tio
Sol
e foi criar vermes)
Referência:
CUMMINGS, E. E. nobody
loses all the time / ninguém perde o tempo todo. Tradução de Mário Domingues.
In: __________. O tigre de veludo (alguns poemas). Seleção e tradução de
Adalberto Müller, Mario Domingues e Mauricio Cardozo. Brasília, DF: Editora da
UnB, 2007. Em inglês: p. 60 e 62; em português: 61 e 63. (Coleção ‘Poetas do
Mundo’)
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