O falante é daqueles
que, em laboratório, tem o poder de vida e de morte sobre os animais utilizados
em experiências científicas: mostra ele certa sensibilidade em relação ao que possa
suceder a tais seres sencientes – coelhos, gatos, cães, leitões etc. –, “em nome
de toda a beleza do mundo”, “em nome de toda a tristeza do mundo”. Mas tudo não
passa apenas de alguns segundos, após os quais logo alguém irrompe a impor ordem
de matança imediata (quando não, o próprio falante é que se autoimpõe a prontidão
do ato).
Em tempo: a
legislação sobre o emprego de animais em experiências de laboratório tem mudado
bastante em muitos países, quer em razão da quantidade exorbitante de animais
empregados rotineiramente em tais experimentos – estima-se algo da ordem de
duzentos milhões –, quer porque grande parte da investigação, então levada a
efeito, produz dor e mal-estar aos animais, sem qualquer resultado ou
conhecimento aplicável em benefício dos seres humanos.
J.A.R. – H.C.
Dennis O’Driscoll
(1954-2012)
Experimental Animals
(after Miroslav Holub)
It’s much cushier
when it’s raining rabbits
than cats and dogs.
The animals for experiment
should not betray too
much intelligence.
It grows unnerving to
watch their actions mimic yours;
terror and horror you
can empathise with.
But, for real
heartbreak, take a newborn pig.
Fantastically ugly;
possessing nothing
and desiring nothing
except its swig of milk;
legs warping under
all that weight
of uselessness,
stupidity and snout.
When I must kill a
piglet, I hesitate a while.
For about five or six
seconds.
In the name of all
the beauty of the world.
In the name of all
the sadness of the world.
‘What’s keeping you?’,
someone bursts in then.
Or I burst in on
myself.
Experimento com um
Pássaro
numa Bomba de Ar
(Joseph Wright of
Derby: pintor inglês)
Animais Experimentais
(ao modo de Miroslav
Holub)
É bem mais cômodo
quando se tem um monte de coelhos
do que cães e gatos. Os
animais para experimentos
não devem revelar
demasiada inteligência.
Torna-se inquietante
ver as ações deles imitarem as tuas;
terror e horror com
os quais possas te identificar.
Mas, para um autêntico
pesar, tome um porco recém-nascido.
Fantasticamente
disforme; sem possuir nada
e sem nada desejar,
exceto o seu gole de leite;
as pernas empenadas
sob todo aquele peso
de inutilidade,
estupidez e focinho.
Quando tenho que
matar um leitão, hesito um pouco.
Durante uns cinco ou
seis segundos.
Em nome de toda a
beleza do mundo.
Em nome de toda a
tristeza do mundo.
‘O que é que está a
te deter?’, logo alguém esbraveja.
Ou a mim mesmo
esbravejo.
Referência:
O’DRISCOLL, Dennis. Experimental
animals. In: ASTLEY, Neil (Ed.). Staying alive: real poems for unreal
times. 1st. ed. New York, NY: Miramax Books, 2003. p. 218-219.
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