A morte emprega todos
os seus estratagemas para tragar em seus domínios um infausto menino que, sem experiência,
deixa-se levar pelas graças de um inocente brinquedo, quando a sinistra senhora
então esgarça o seu cabedal de maldades: corta-lhe as veias, pica-lhe os olhos,
tira-lhe o fôlego e o abate.
Em associação com o
objeto do poema, lembrei-me de certas cenas do filme “O Sétimo Selo” (1956), do
diretor sueco Ingmar Bergman (1918-2007), nas quais um cavaleiro, deparando com
a morte, propõe-lhe a disputa de uma partida de xadrez, tudo como forma de
ganhar tempo e poder refletir sobre o sentido da vida e – por que não? – da própria
morte.
J.A.R. – H.C.
Mario Benedetti
(1920-2009)
Juego de villanos
La muerte se puso una
cara de monstruo
una cara de monstruo
horrible
esperó y esperó
detrás de la esquina
salió al fin de la
sombra como un trozo de sombra
y el niño huyó más
rápido que su propio alarido.
Entonces la muerte se
puso otra cara
una vieja cara de
mendigo
esperó y esperó
enfrente de la iglesia
extendiendo la mano y
gimiendo su pena
y el niño no supo qué
hacer con su piedad.
Entonces la muerte se
puso otra cara
una cara de mujer
hermosa
esperó y esperó con
los brazos abiertos
tan maternal tan fiel
tan persuasiva
que el niño quedó
inmóvil de susto o de ternura.
Entonces la muerte
sacó su última cara
una cara de juguete
inocente
esperó y esperó
tranquila en la bohardilla
tan quieta tan
trivial tan seductora
que el niño le dio
cuerda con una sola mano.
Entonces la muerte se
animó despacito
más traidora que
nunca y le cortó las venas
y le pinchó los ojos
y le quitó el aliento
y era lo único que
podía esperarse
porque con la muerte
no se juega.
En: “Noción de
patria" (1962-1963)
Sem título
(autor não identificado)
Jogo de vilões
A morte se pôs uma
cara de monstro
uma cara de monstro
horrível
esperou e esperou
atrás da esquina
saiu por fim da
sombra como um naco de sombra
e o menino fugiu mais
rápido que seu próprio alarido.
Então a morte se pôs
outra cara
uma velha cara de
mendigo
esperou e esperou em
frente à igreja
estendendo a mão e
gemendo sua pena
e o menino não soube
o que fazer com sua piedade.
Então a morte se pôs
outra cara
uma cara de mulher
bonita
esperou e esperou com
os braços abertos
tão maternal tão fiel
tão persuasiva
que o menino
permaneceu imóvel com susto ou ternura.
Então a morte lançou
mão de sua última cara
uma cara de brinquedo
inocente
esperou e esperou
tranquila no sótão
tão quieta tão
trivial tão sedutora
que o menino lhe deu
corda com uma só mão.
Então a morte se
animou bem devagar
mais traiçoeira que
nunca e lhe cortou as veias
e lhe picou os olhos
e lhe tirou o fôlego
e era a única coisa
que se poderia esperar
porque com a morte
não se brinca.
Em: “Noção de pátria”
(1962-1963)
Referência:
BENEDETTI, Mario. Juego
de villanos. In: __________. Antología poética. Introducción de Pedro
Orgambide. Selección del autor. 4. ed. 8. reimp. Madrid, ES: Alianza Editorial,
2017. p. 84-85. (‘El libro de bolsillo’)
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