Esta é apenas a
primeira seção de um longo poema em sete partes, no qual o poeta português divaga
sobre a vida e os seus sentidos (ou seria melhor dizer o seu “nonsense”?!):
abordam-se, aqui, as preocupações dos pais antes de a criança nascer, o método
para lhe determinar o sexo e outros desencadeamentos já vislumbrados em seu
futuro.
Mas a vida é muito
mais contingência do que poderia antever as melhores técnicas do planejamento
humano, e todo o desvelo que se tenha por um futuro de bem-estar e fortuna está
à mercê de águas circundantes, sobre as quais não temos suficiente domínio,
para que possamos autoatribuírmos méritos totais se acaso lá chegarmos!
J.A.R. – H.C.
Vasco Graça Moura
(1942-2014)
da vida humana
1
dizem que vais
nascer, que há métodos de
determinar-te o sexo,
que a tua mãe deseja
respirar o teu sopro,
tua mobilidade,
teu mamar; tirar o
teu retrato.
para quê prever-te o
nome ou preparar
roupas rendadas?
ninguém há-de cumprir-te
que te cumpras. e
tentarão salvar-te a alma
com água e óleo e
sal.
virás a amar alguém?
a adoecer
apesar das vacinas? a
sentar-te
nas margens do real a
contemplá-lo
tristemente? jogarás
à bola, ao pião,
mais tarde ao sete e
meio? (*)
para quê ser loquaz
do teu futuro?
Em: “Os rostos comunicantes”
(1984)
Brincando com uma boneca
(Bernard Pothast:
pintor belgo-holandês)
Nota:
(*). Sete e meio: trata-se de um jogo de cartas, jogado com um baralho de
40 (quarenta) cartas; para conhecimento de suas regras, conecte-se a este endereço.
Referência:
MOURA, Vasco Graça.
da vida humana – 1. In: MÃE, Valter Hugo (Selecção e Organização). O futuro
em anos-luz: 100 anos. 100 poetas. 100 poemas. Antologia da poesia
portuguesa. 1. ed. Vila Nova de Famalicão, PT: Quasi Edições, abr. 2011. p. 131.
(Coleção ‘Finita Melancolia’; n. 9)
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