Alpes Literários

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UM PASSEIO PELOS ALPES LITERÁRIOS

sábado, 27 de agosto de 2022

Vasco Graça Moura - da vida humana – 1

Esta é apenas a primeira seção de um longo poema em sete partes, no qual o poeta português divaga sobre a vida e os seus sentidos (ou seria melhor dizer o seu “nonsense”?!): abordam-se, aqui, as preocupações dos pais antes de a criança nascer, o método para lhe determinar o sexo e outros desencadeamentos já vislumbrados em seu futuro.

 

Mas a vida é muito mais contingência do que poderia antever as melhores técnicas do planejamento humano, e todo o desvelo que se tenha por um futuro de bem-estar e fortuna está à mercê de águas circundantes, sobre as quais não temos suficiente domínio, para que possamos autoatribuírmos méritos totais se acaso lá chegarmos!

 

J.A.R. – H.C.

 

Vasco Graça Moura

(1942-2014)

 

da vida humana

 

1

 

dizem que vais nascer, que há métodos de

determinar-te o sexo, que a tua mãe deseja

respirar o teu sopro, tua mobilidade,

teu mamar; tirar o teu retrato.

 

para quê prever-te o nome ou preparar

roupas rendadas? ninguém há-de cumprir-te

que te cumpras. e tentarão salvar-te a alma

com água e óleo e sal.

 

virás a amar alguém? a adoecer

apesar das vacinas? a sentar-te

nas margens do real a contemplá-lo

tristemente? jogarás à bola, ao pião,

 

mais tarde ao sete e meio? (*)

para quê ser loquaz do teu futuro?

 

Em: “Os rostos comunicantes” (1984)

 

Brincando com uma boneca

(Bernard Pothast: pintor belgo-holandês)

 

Nota:

 

(*). Sete e meio: trata-se de um jogo de cartas, jogado com um baralho de 40 (quarenta) cartas; para conhecimento de suas regras, conecte-se a este endereço.

 

Referência:

 

MOURA, Vasco Graça. da vida humana – 1. In: MÃE, Valter Hugo (Selecção e Organização). O futuro em anos-luz: 100 anos. 100 poetas. 100 poemas. Antologia da poesia portuguesa. 1. ed. Vila Nova de Famalicão, PT: Quasi Edições, abr. 2011. p. 131. (Coleção ‘Finita Melancolia’; n. 9)

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