Alpes Literários

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UM PASSEIO PELOS ALPES LITERÁRIOS

domingo, 1 de maio de 2022

William Matthews - Paisagem com Espectador

O espectador noturno está à janela e observa a lua cheia no firmamento e o seu reflexo nas águas de um lago: logo pondera como ela se parece a uma “laranja recém descascada” em meio à paisagem, a qual, em terra, integra-se à vegetação, melhor dizendo, às árvores com “folhas crestadas e frágeis”, prestes a cair.

 

Contrariamente à “sensualidade de bem-estar” com que se sustenta a lua, o observador experimenta o medo – qual água a subir num poço –, a lhe assaltar o espírito na “calada da noite”, acompanhado por um “incômodo suor metálico”, gotejante feito “vil orvalho”, levando-o a sentir-se como se ameaçado por um afogo, à deriva de um frio perspirar. Augúrios da lua cheia?!

 

J.A.R. – H.C.

 

William Matthews

(1942-1997)

 

Landscape with Onlooker

 

One night shy of full, fat as a beach ball, the moon

looks not lonesome shining through the trees, but replete

 

with the thoughtless sensuality of well-being.

A chill in the air? No, under the air, like water

 

under a swimmer. The unsteadfast leaves grow crisp

and brittle, the better to fall away. Some nights

 

fear, like rising water in a well, fills these hours –

the dead of night, as the phrase goes, when you quicken

 

and the dank metallic sweat beads like a vile dew.

But tonight you stand at your window, framed and calm,

 

and the air’s as sweet as a freshly peeled orange.

There’s a moon on the lake, and another in the sky.

 

Mulher à espera do sol nascente

(Caspar David Friedrich: pintor alemão)

 

Paisagem com Espectador

 

Certa noite, acanhada de cheia, gorda como bola

de praia, a lua

não parece solitária brilhando entre as árvores,

mas repleta

 

da impensada sensualidade de bem-estar.

Um frio no ar? Não, sob o ar, como água

 

sob um nadador. As folhas inconstantes ficam crestadas

e frágeis, para melhor caírem. Certas noites

 

o medo, como água subindo no poço, enche as horas –

na calada da noite, como se diz, quando a gente se agita

 

e o incômodo suor metálico goteja como vil orvalho.

Mas hoje à noite ficas à janela, emoldurada e calma,

 

e o ar é tão doce quanto uma laranja recém descascada.

Há uma lua no lago e outra no céu.

 

Referência:

 

MATTHEWS, William. Landscape with onlooker / Paisagem com espectador. Tradução de Maria Lúcia Milléo Martins. In: O’SHEA, José Roberto (Org.). Antologia de poesia norte-americana contemporânea. Tradução de Maria Lúcia Milléo Martins. Florianópolis, SC: Ed. da UFSC, 1997. Em inglês: p. 122; em português: p. 123.

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