Alpes Literários

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Subtítulo

UM PASSEIO PELOS ALPES LITERÁRIOS

terça-feira, 24 de maio de 2022

Celina Ferreira - Fragmento

Uma coisa é observar os eventos e trazê-los na memória até o tempo presente, para lhes reavivar as imagens; outra, saber da transitoriedade, da efemeridade da existência, imersa na contingência de todas as manifestações fenomênicas – como a própria vida da poetisa, metaforizada em “um desenho de voo e um balançar de ramos”.

 

O título do poema – “Fragmento” – já revela por si só o caráter precário e fugaz da paisagem existencial, tantas vezes evocado nas obras de ilustração orientais: sublinham elas o império emblemático dos ciclos, diante dos quais o ser humano não deve apegar-se às aparências, senão tão apenas fruir-lhes a beleza e os finitos prazeres que proporcionam.

 

J.A.R. – H.C.

 

Celina Ferreira

(1928-2012)

 

Fragmento

 

Uma coisa é eu estar olhando a tarde e o tempo

em vertical, caindo como chuva. Uma coisa

é eu falar sozinha uma palavra e, receosa,

ferir de medo a minha solidão.

Eis que uns ramos frágeis de hera balançaram

e um pássaro traçou o voo que nunca se apagará

na minha lembrança. Outra coisa é eu saber

que a minha vida é um desenho de voo e um

balançar de ramos.

 

Garota em um balanço

(Winslow Homer: pintor norte-americano)

 

Referência:

 

FERREIRA, Celina. Fragmento. In: BRAGA, Rubem. A poesia é necessária. Organização de André Seffrin. São Paulo, SP: Global, 2015. p. 127.

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