Alpes Literários

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UM PASSEIO PELOS ALPES LITERÁRIOS

sábado, 28 de maio de 2022

Henry Bataille - O passado (Fragmento)

O passado como um segundo coração a bater no peito, mas que, sem materialidade, somente se faz sentir por uma “violenta pulsação” “nas tardes cheias de alma em que essa voz ressoa”: as palavras do poeta, s.m.j., fala-nos da beleza nostálgica de um declínio, imagem e hora da saudade e da melancolia, quando a vida se aproxima de seu crepúsculo.

 

Há quem prefira não reviver o passado, sacudindo a poeira das sandálias, quer na tentativa de sufocar sentimentos de culpa indelevelmente gravados na memória, quer para esquecer experiências dolorosas associadas à família, amizades ou ao próprio país de nascimento.

 

Outros há, como o poeta, que procuram acessar a beleza retida nos eventos do passado, à procura de resgatar, talvez, fórmulas que deram certo para replicá-las no presente, mas que, pelo visto, acabam por desencaminhar-se no labirinto simbólico das coisas acontecidas.

 

J.A.R. – H.C.

 

Henry Bataille

(1872-1922)

 

Le passé

(Fragment)

 

Le passé, c’est un second cœur qui bat en nous…

on l’entend, dans nos chairs, rythmer à petits coups,

sa cadence, pareille à l’autre cœur, – plus loin,

l’espace est imprécis où ce cœur a sa place,

mais on l’entend, comme un grand écho, néanmoins,

alimenter le fond de l’être et sa surface.

Il bat. Quand le silence en nous se fait plus fort

cette pulsation mystérieuse est là

qui continue… Et quand on rêve il bat encor,

 

et quand on souffre il bat, et quand on aime il bat…

Toujours! C’est un prolongement de notre vie…

Mais si vous recherchez, pour y porter la main,

où peut être la source heureuse et l’eurythmie

de son effluve… Rien!… Vous ne trouverez rien

sous les doigts… Il échappe. Illusion… Personne

ne l’a trouvé jamais… Il faut nous contenter

d’en sentir, à coups sourds, l’élan précipité,

dans les soirs trop humains où ce grand cœur résonne.

 

O passado era o seu melhor amigo

(Erik Pevernagie: pintor belga)

 

O passado

(Fragmento)

 

Ele é um segundo coração que bate em nós.

Surdamente, na carne, ouve-se a sua voz

Num ritmo igual ao do primeiro coração.

A gente ignora onde ele esteja: ouve-o bater

E vir, num eco imenso, numa ondulação,

Alimentar o fundo e o nível do seu ser.

Bate. Quando o silêncio é mais forte, eis que vem

Aquela pulsação misteriosa e nos chama

Sempre... e quando se sonha ele bate também,

 

Quando se sofre, bate... e bate quando se ama...

É uma continuação da nossa própria vida...

Mas, quando a gente tenta alcançá-la com a mão,

Onde esteja a cadência ou a fonte escondida

Do seu eflúvio... Nada! Inútil! Ilusão!           

Ele escapa entre os dedos. Vai-se. Foge. Voa...

Ninguém nunca o tocou... E a gente se contenta

Só com poder sentir-lhe a pulsação violenta

Nas tardes cheias de alma em que essa voz ressoa...

 

Referência:

 

BATAILLE, Henry. Le passé (Fragment) / O passado (Fragmento). Tradução de Guilherme de Almeida. In: ALMEIDA, Guilherme de (Seleção e tradução). Poetas de França. Prefácio de Marcelo Tápia. 5. ed. São Paulo, SP: Babel, 2011. Em francês: p. 148; em português: p. 149.

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