Maio é o mês em que a
natureza se extasia aos acordes da cítara de Orfeu, mais parecendo, pela pena
do poeta, jornalista e professor baiano, um intercurso de primavera boreal do
que, em terras meridionais, se poderia esperar diante de paisagens conformes ao
outono da época.
Nas cinco quintilhas,
tem-se o fluir dos versos em um timbre clássico, com referências à mitologia,
sobretudo grega, ou mesmo à própria literatura – como no caso da alusão à “Marília
de Dirceu”.
No mais, diriam os arautos
da modernidade que o emprego da palavra “judeu”, como qualificação ao
substantivo “temporal”, à luz dos dias que correm, revela-se “politicamente
incorreto”, porque eivado de um sentido pejorativo, vale dizer, concernente à
malvadez, à má índole.
J.A.R. – H.C.
Sosígenes Costa
(1901-1968)
Maio
Maio nasceu nas
grutas das colinas.
Nas colinas azuis
Maio nasceu.
As suas mãos são
pombas cristalinas
e paira-lhe na boca, entre
cravinas,
o sorriso melódico de
Orfeu.
Maio nasceu nas
grutas das colinas.
Nas colinas azuis
Maio nasceu.
Ao pé de Maio as
musas bailarinas
estão bailando
esgalgas e mais finas
que uma jarra, uma
lira, um caduceu.
Maio nasceu nas
grutas das colinas.
Não vá feri-lo o
temporal judeu!
Seus cabelos são como
os das ondinas,
verdes madeixas muito
esmeraldinas,
mais verdes do que os
olhos de Nereu.
Porque Maio nas
grutas das colinas
há cinco dias,
cândido, nasceu,
a terra veste galas e
boninas
e está, por entre as
rosas solferinas,
mais bela que a
Marília de Dirceu.
Maio nasceu nas
grutas das colinas,
com seu lindo perfil
de camafeu.
Maio das rezas, das
canções divinas,
irmão das doces musas
bailarinas,
filho das rosas,
adorado meu.
(1928)
Em: “Versos de uma
Era Extinta”
Outono
(Maurice B.
Prendergast: artista américo-canadense)
Referência:
COSTA, Sosígenes.
Maio. In: __________. Obra poética. 1. ed. Rio de Janeiro, RJ: Leitura,
1959. p. 120-121.
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