Alpes Literários

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UM PASSEIO PELOS ALPES LITERÁRIOS

sábado, 7 de maio de 2022

W. H. Auden - Inferno

Auden nos oferece nestes versos um tocante esboço daquilo que se configura, de um lado, como uma pungente alienação psicológica e, por outro, o tormento de se viver coletivamente em um estado de insensibilidade, quando, a toda prova, as emoções tornam-se embotadas, tudo como resultante de um quadro de impotência e de paralisia produzido, em boa medida, pela turbulência da vida social e pela vulnerabilidade dos cidadãos a uma moral duvidosa.

 

Somos nós mesmos, portanto, que criamos o cenário angustioso do “Inferno” em que imersos, essa ansiedade neurótica que “não está nem aqui nem lá”, senão na mente do próprio homem: a autodestruição, de todo modo, é um encargo desafiador, e é “Só o desafio à nossa vontade / Nosso orgulho de aprender alguma arte” o que nos faz preferir o mais afanoso dos caminhos.

 

J.A.R. – H.C.

 

W. H. Auden

(1907-1973)

 

Hell

 

Hell is neither here nor there

Hell is not anywhere

Hell is hard to bear.

 

It is so hard to dream posterity

Or haunt a ruined century

And so much easier to be.

 

Only the challenge to our will,

Our pride in learning any skill,

Sustains our effort to be ill.

 

To talk the dictionary through

Without a chance word coming true

Is more than Darwin’s apes could do.

 

Yet pride alone could not insist

Did we not hope, if we persist,

That one day Hell might actually exist.

 

In time, pretending to be blind

And universally unkind

Might really send us out of our mind.

 

If we were really wretched and asleep

It would be easy then to weep,

It would be natural to lie,

There’d be no living left to die.

 

A Boca do Inferno

(Pieter Bruegel, o Velho: pintor flamengo)

 

Inferno

 

O inferno não está aqui nem lá

O inferno não está em lugar algum

O inferno é árduo de suportar.

 

É tão difícil imaginar posteridade

Ou perseguir um século destruído

E tão mais fácil o ser-se.

 

Só o desafio à nossa vontade,

Nosso orgulho de aprender alguma arte,

Sustenta nosso esforço de ser mau.

 

Pesquisar o dicionário inteiro

Sem o encontro de uma palavra verdadeira

Está além do que os monos de Darwin podem fazer.

 

Contudo o orgulho somente não pode insistir

Não havendo esperança, se persistimos

Que um dia o Inferno deve existir.

 

Em tempo, fingindo-nos de cegos

E universalmente cruéis

Podemos em verdade tornarmo-nos loucos.

 

Se realmente estivéssemos exaustos e dormindo,

Seria fácil então chorar,

Seria natural mentir,

Não restará vida para morrer.

 

Referência:

 

AUDEN, W. H. Hell / Inferno. Tradução de Yolanda Jordão. Revista da Academia Brasiliense de Letras (ABrL), Brasília (DF), ano VIII, nº 9, p. 165-166 (em inglês) / p. 164-165 (em português), set. 1989.

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