Há um país da chuva,
por onde o pai do falante esteve a vaguear solitariamente, a bem dizer, em
completa privacidade, levando a efeito os seus bucólicos afazeres em integração
com a natureza: a perspectiva é de um adulto, refletindo sobre os modos como percebia,
quando criança, o interesse do genitor em labutar sob as águas vindas dos céus.
O hábito do pai de
levantar-se à primeira luz do dia para mourejar em favor dos seus levou-me a
recordar o poema “Aqueles
Domingos de Inverno”, de Robert Hayden, pois ambos os autores buscam manter
viva a afeição que tinham por seus progenitores, os quais, cada um a seu modo,
exibiam mediante o zelo pela família todo o amor de que eram capazes.
J.A.R. – H.C.
Robert Morgan
(n. 1944)
Working in the Rain
My father loved more
than anything to
work outside in wet
weather. Beginning
at daylight he’d go
out in dripping brush
to mow or pull weeds
for hog and chickens.
First his shoulders
got damp and the drops from
his hat ran down his
back. When even his
armpits were soaked
he came in to dry out
by the fire, making
coffee, read a little.
But if the rain
continued he’d soon be
restless, and go out
to sharpen tools in
the shed or carry
wood from the pile,
then open up a puddle
to the drain,
working by steps back
into the downpour.
I thought he sought
the privacy of rain,
the one time no one
was likely to be
out and he was left
to the intimacy
of drops touching
every leaf and tree in
the woods and the
easy mutterings of
drip and runoff, the
shine of pools behind
grass dams. He could
not resist the long
ritual, the
companionship and freedom
of falling weather, or
even the cold
drenching, the heavy
soak and chill of clothes
and sobbing of
fingers and sacrifice
of shoes that earned
a baking by the fire
and washed fatigue
after the wandering
and loneliness in the
country of rain.
Caubóis trabalhando
sob chuva
(Ted Long: artista
norte-americano)
Trabalhando Sob Chuva
Meu pai gostava mais
do que tudo de
trabalhar ao ar livre
sob tempo chuvoso. Começando
à luz do dia, saía em
direção ao matagal
para cortar ou
arrancar ervas daninhas para o porco
e as galinhas.
Primeiro seus ombros
ficavam molhados e as gotas
do seu chapéu escorriam-lhe pelas costas. Quando até as
suas axilas estavam
encharcadas, entrava para secar-se
junto ao fogo, fazer
café e ler um pouco.
Mas se a chuva
continuasse, logo ficaria
inquieto e sairia
para afiar as ferramentas no
galpão ou transportar
lenha da pilha,
depois abriria uma
poça para o dreno,
trabalhando por
etapas de volta ao aguaceiro.
Pensava eu que buscasse
a privacidade da chuva,
a única oportunidade em que era improvável que alguém
saísse, deixando-o a
sós na intimidade
das gotas que tocavam
cada folha e árvore
nos bosques, os
suaves murmúrios do
gotejo e da vazão, o
brilho dos charcos por trás
das motas de grama.
Ele não pôde resistir ao longo
ritual, ao
companheirismo e à liberdade
de uma estação
chuvosa, ou mesmo ao frio
empapamento, ao peso do encharco, às roupas álgidas,
ao soluçar dos dedos
e ao sacrifício
dos sapatos – que ganhavam um desidrato junto ao fogo –,
e à ensopada fadiga
após a vagueação
solitária pelo país
da chuva.
Referência:
MORGAN, Robert.
Working in the rain. In: KEILLOR, Garrison (Selector and Introducer). Good
poems. New York, NY: Penguin Books, 2003. p. 373.
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