Mesmo expostos a uma
condição de dúvida em relação à presumível animosidade da vasta fauna do mundo
natural ou mesmo em relação aos próprios pares, diante da possibilidade de um alheamento
que lhes pode custar a própria vida, os humanos acabam por vencer o medo do
desconhecido e lançam-se a visitar o irmão lupino, à espera na sala ao lado.
Aludindo ou não Tate à
máxima hobbesiana – “O homem é o lobo do homem.” –, ou ainda à sentença de
Sartre – “O inferno são os outros.” –, pouco importa, pois o que vale é a
natureza gregária do ser humano, quando então ressoa com mais força a expressão
milenar do Estagirita, considerando que fomos feitos para viver em sociedade: “O
homem é um animal político.”
J.A.R. – H.C.
Allen Tate
(1899-1979)
The Wolves
There are wolves in
the next room waiting
With heads bent low,
thrust out, breathing
At nothing in the
dark; between them and me
A white door patched
with light from the hall
Where it seems never
(so still is the house)
A man has walked from
the front door to the stair.
It has all been
forever. Beasts claw the floor.
I have brooded on
angels and archfiends
But no man has ever
sat where the next room’s
Crowded with wolves,
and for the honor of man
I affirm that never
have I before. Now while
I have looked for the
evening star at a cold window
And whistled when
Arcturus spilt his light,
I’ve heard the wolves
scuffle, and said: So this
Is man; so – what
better conclusion is there –
The day will not
follow night, and the heart
Of man has a little
dignity, but less patience
Than a wolf’s, and a
duller sense that cannot
Smell its own
mortality. (This and other
Meditations will be
suited to other times
After dog silence
howls his epitaph.)
Now remember courage,
go to the door,
Open it and see
whether coiled on the bed
Or cringing by the
wall, a savage beast
Maybe with golden
hair, with deep eyes
Like a bearded spider
on a sunlit floor
Will snarl – and man
can never be alone.
Lobos na primavera
(Lucie Bilodeau:
artista canadense)
Os Lobos
Há lobos de tocaia no
quarto aí do lado.
De cabeça abaixada,
tensos, respirando
No escuro, contra o
nada; há entre nós
Alva porta crivada
pela luz do vestíbulo
Onde parece nunca
(tão calma a casa) alguém
Ter andado da porta
até a escada.
Eu, que anjos
engendrei e arquidemônios,
Jamais vi sentar-se
alguém no quarto ao lado,
Transbordante de
lobos e afirmo, para honra
Dos homens, que eu
tampouco. Mas, enquanto
Buscava, à janela
fria, a estrela vespertina,
E assobiava quando
Arturo vertia sua luz,
Ouvi o rugir dos lobos
e disse: então é isto
O homem: então – que
conclusão melhor tirar? –
O dia não virá depois
da noite, e o coração
Do homem tem certa
dignidade, porém menos paciência
Que o de um lobo, e
sentidos embotados, incapazes
De farejar sua
própria mortalidade. (Estas e outras
Meditações são mais
para outros tempos, quando
O silêncio canino
uivar seu epitáfio).
Agora lembra-te,
coragem, vai e abre a porta.
Vê como envolta na
cama, ou enroscada
Junto à parede, uma
besta selvagem
Talvez de juba de
ouro, de olhos fundos
Tal aranha peluda em
piso ensolarado,
Rosnará para ti,
rilhando os dentes
– Pois o homem não
pode estar a sós.
Referência:
TATE, Allen. The
wolves / Os lobos. Tradução de Mário Faustino. In: FAUSTINO, Mário. Poesia
completa – Poesia Traduzida. 1. ed. Introdução, organização e notas de
Benedito Nunes. São Paulo, SP: Max Limonad, 1985. Em inglês: p. 272; em
português: p. 273.
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