Mirando para uma
fortuna marcadamente “lusíada”, o poeta percorre a história, para de lá evocar
os elementos de uma epopeia de conquistas e de declínios, como se a pátria
portuguesa houvesse incorporado a sina de Sísifo, em pugna contra um fado que, distintamente
de lhe impor a repetição de um mesmo ato, sublima-se em outras tantas formas de
seguir ao encalço da glória.
As conquistas
intrépidas pelo mar, as lutas pela independência das colônias africanas, as
próprias transformações intestinas – leia-se, em especial, a “Revolução dos
Cravos”, de abril de 1974 –, são referentes que se podem deduzir dos versos do
poema.
E por que não se poderiam
consignar também, a propósito de tamanhos feitos e em sede de oportuna vinculação,
as páginas expressivas de Eduardo Lourenço (1923-2020) em “O Labirinto da
Saudade”, de 1978, por meio das quais empreende, como se diz no subtítulo, uma autêntica
“psicanálise mítica do destino português”?!
J.A.R. – H.C.
Aidenor Aires
(n. 1946)
Lusíada
De tanto te inundarem
lágrimas de África,
Portugal,
teu mar transborda.
Pelas ruas resvalam
cravos rubros
desatando luas
na sombra de lutos e
esperas.
Portugal,
águias negras em
Moçambique,
harpias em Angola
e naus de homens
livres
nos campos de Bissau.
Os dias são passados,
Portugal,
é morto o rei, é
posto o trono
à espera de Sísifo,
sua montanha
de pena e recomeço.
Tempestade no Mar
(Pieter Mulier II:
pintor holandês)
Referência:
AIRES, Adenor.
Lusíada. In: __________. 50 poemas escolhidos pelo autor: Aidenor Aires.
Rio de Janeiro, RJ: Edições Galo Branco, 2009. p. 71. (Coleção ‘50 poemas
escolhidos pelo autor’; v. 41)
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