O falante dirige-se aos cidadãos de Chartres, comuna francesa com cerca de quarenta mil habitantes – certamente, bem menos à época da construção da famosa catedral, ao longo dos séculos XII e XIII –, qualificando-os como “gulosos de imagens”, ou melhor, homens e mulheres piedosos que tencionavam legar algo de concreto e deslumbrante aos visitadores da urbe no futuro.
Agora, segundo o ente lírico, não mais prepondera a sede de imortalidade por meio de obras que tenham o condão de atravessar os reveses do tempo, na mais pura tangibilidade – mesmo que devotadas a um ideário transcendente, nobre, divino, como era o caso –, senão a de ideias que tenham viço para perdurar, com esteio numa presumível invulnerabilidade.
J.A.R. – H.C.
Armindo Trevisan
(n. 1933)
Imagens
Éreis gulosos de imagens,
cidadãos de Chartres!
Em vossos vitrais
e naves
tínheis dez mil figuras.
Uma figura para cada habitante, senhores,
que adoráveis Deus
com ardente piedade, e à Virgem
consagráveis a amêndoa
de vossos corações.
Somos diferentes de vós!
Miramos vossas estátuas
desinteressados dos vossos santos.
Mal vemos o Cristo,
que nos acena do portal ocidental.
Nossa imaginação
é maior do que a vossa?
Nossos olhos,
menos ávidos do que os vossos?
Orai por nós, homens do século XIII!
Não construiremos mais catedrais
de pedras.
Necessitamos de ideias
que não morram conosco.
Em: “A Serpente na Grama” (2001)
Catedral de Chartres
(Jean-Baptiste Camille Corot: pintor francês)
Referência:
TREVISAN, Armindo. Imagens. In:
__________. Nova antologia poética: 1967-2001. Porto Alegre, RS: Sulina,
2001. p. 200.
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