Alpes Literários

Alpes Literários

Subtítulo

UM PASSEIO PELOS ALPES LITERÁRIOS

sábado, 6 de novembro de 2021

Alberto Ríos - Nani

O poeta descreve um dia em que esteve ao almoço com a sua avó, ele falando em inglês e ela em espanhol, mas ambos tendo a comida como uma linguagem por meio da qual se entendiam: o orador escutava a “fala” das rugas no rosto de Nani, a repassar todos os momentos por ela vividos em companhia das crianças, do avô já falecido e, por extensão, “disto e daquilo”.

Para ciência, tenha-se que Alberto Ríos, literato e poeta norte-americano, é filho de pai mexicano e de mãe inglesa. Daí um certo pesar que expressa em razão da perda de certos laços culturais em que enleada a família, melhor dizendo, na linha ascendente, pois que o inglês foi o idioma que passou então a dominar entre os mais novos.

J.A.R. – H.C.

 

Alberto Ríos

(n. 1952)

 

Nani

 

Sitting at her table, she serves

the sopa de arroz to me

instinctively, and I watch her,

the absolute mamá, and eat words

I might have had to say more

out of embarrassment. To speak,

now-foreign words I used to speak,

too, dribble down her mouth as she serves

me albondigas. No more

than a third are easy to me.

By the stove she does something with words

and looks at me only with her

back. I am full. I tell her

I taste the mint, and watch her speak

smiles at the stove. All my words

make her smile. Nani never serves

herself, she only watches me

with her skin, her hair. I ask for more.

 

I watch the mamá warming more

tortillas for me. I watch her

fingers in the flame for me.

Near her mouth, I see a wrinkle speak

of a man whose body serves

the ants like she serves me, then more words

from more wrinkles about children, words

about this and that, flowing more

easily from these other mouths. Each serves

as a tremendous string around her,

holding her together. They speak

nani was this and that to me

and I wonder just how much of me

will die with her, what were the words

I could have been, or was. Her insides speak

through a hundred wrinkles, now, more

than she can bear, steel around her,

shouting, then, What is this thing she serves?

 

She asks me if I want more.

I own no words to stop her.

Even before I speak, she serves.

 

O aniversário da avó

(Ferdinand G. Waldmuller: pintor austríaco)

 

Nani

 

Sentado à sua mesa, serve-me

a sopa de arroz

instintivamente, e a observo,

a mamã absoluta, e engulo palavras

que poderia haver tido que dizer

mais por embaraço. Em prol da fala,

agora, palavras estrangeiras, que também eu poderia

articular, gotejam de sua boca enquanto me serve

almôndegas. Não mais

do que um terço são fáceis para mim.

Junto ao fogão faz algo com as palavras

e somente me olha virando-se

para trás. Estou farto. Digo-lhe

que provaria a menta e a vejo falar, mediante

sorrisos, encostada ao fogão. Todas as minhas palavras

levam-na a sorrir. Nani nunca serve

a si mesma, somente me observa

com sua pele, seus cabelos. Peço-lhe mais.

 

Observo a mamã aquecendo mais

tortilhas para mim. Vejo os seus dedos,

a mim devotados, em meio à chama.

Perto de sua boca, noto uma ruga a falar

de um homem cujo corpo serve

às formigas, tal como ela me serve; logo, mais palavras

a partir de mais rugas, sobre crianças, palavras

sobre isto e aquilo, fluindo mais

facilmente dessas outras bocas. Cada uma serve

como uma tremenda corda ao seu redor,

mantendo-a presa às demais. Elas dizem

que Nani foi isto e aquilo para mim

e me pergunto quanto de mim

com ela há de morrer, quais foram as palavras

que eu poderia ter sido, ou fui. O seu interior fala

através de uma centena de rugas, agora, mais do que

é capaz de as suportar, ligas aceradas em torno dela,

a vociferar, então: ‘O que é esta coisa que ela serve?’

 

Pergunta-me se quero mais.

Não tenho palavras para detê-la.

Antes mesmo de lhe responder, ela me serve.


Referência:

RÍOS, Alberto. Nani. In: MAYES, Frances. The discovery of poetry: a field guide to reading and writing poems. 1st Harvest ed. San Diego, CA: Harvest & Harcout, 2001. p. 162-163.

Nenhum comentário:

Postar um comentário