O poeta descreve um dia em que esteve ao almoço com a sua avó, ele falando em inglês e ela em espanhol, mas ambos tendo a comida como uma linguagem por meio da qual se entendiam: o orador escutava a “fala” das rugas no rosto de Nani, a repassar todos os momentos por ela vividos em companhia das crianças, do avô já falecido e, por extensão, “disto e daquilo”.
Para ciência, tenha-se que Alberto Ríos, literato e poeta norte-americano, é filho de pai mexicano e de mãe inglesa. Daí um certo pesar que expressa em razão da perda de certos laços culturais em que enleada a família, melhor dizendo, na linha ascendente, pois que o inglês foi o idioma que passou então a dominar entre os mais novos.
J.A.R. – H.C.
Alberto Ríos
(n. 1952)
Nani
Sitting at her table, she serves
the sopa de arroz to me
instinctively, and I watch her,
the absolute mamá, and eat words
I might have had to say more
out of embarrassment. To speak,
now-foreign words I used to speak,
too, dribble down her mouth as she serves
me albondigas. No more
than a third are easy to me.
By the stove she does something with words
and looks at me only with her
back. I am full. I tell her
I taste the mint, and watch her speak
smiles at the stove. All my words
make her smile. Nani never serves
herself, she only watches me
with her skin, her hair. I ask for more.
I watch the mamá warming more
tortillas for me. I watch her
fingers in the flame for me.
Near her mouth, I see a wrinkle speak
of a man whose body serves
the ants like she serves me, then more words
from more wrinkles about children, words
about this and that, flowing more
easily from these other mouths. Each serves
as a tremendous string around her,
holding her together. They speak
nani was this and that to me
and I wonder just how much of me
will die with her, what were the words
I could have been, or was. Her insides speak
through a hundred wrinkles, now, more
than she can bear, steel around her,
shouting, then, What is this thing she serves?
She asks me if I want more.
I own no words to stop her.
Even before I speak, she serves.
O aniversário da avó
(Ferdinand G. Waldmuller: pintor austríaco)
Nani
Sentado à sua mesa, serve-me
a sopa de arroz
instintivamente, e a observo,
a mamã absoluta, e engulo palavras
que poderia haver tido que dizer
mais por embaraço. Em prol da fala,
agora, palavras estrangeiras, que também eu poderia
articular, gotejam de sua boca enquanto me serve
almôndegas. Não mais
do que um terço são fáceis para mim.
Junto ao fogão faz algo com as palavras
e somente me olha virando-se
para trás. Estou farto. Digo-lhe
que provaria a menta e a vejo falar, mediante
sorrisos, encostada ao fogão. Todas as minhas
palavras
levam-na a sorrir. Nani nunca serve
a si mesma, somente me observa
com sua pele, seus cabelos. Peço-lhe mais.
Observo a mamã aquecendo mais
tortilhas para mim. Vejo os seus dedos,
a mim devotados, em meio à chama.
Perto de sua boca, noto uma ruga a falar
de um homem cujo corpo serve
às formigas, tal como ela me serve; logo, mais
palavras
a partir de mais rugas, sobre crianças, palavras
sobre isto e aquilo, fluindo mais
facilmente dessas outras bocas. Cada uma serve
como uma tremenda corda ao seu redor,
mantendo-a presa às demais. Elas dizem
que Nani foi isto e aquilo para mim
e me pergunto quanto de mim
com ela há de morrer, quais foram as palavras
que eu poderia ter sido, ou fui. O seu interior
fala
através de uma centena de rugas, agora, mais do que
é capaz de as suportar, ligas aceradas em torno
dela,
a vociferar, então: ‘O que é esta coisa que ela
serve?’
Pergunta-me se quero mais.
Não tenho palavras para detê-la.
Antes mesmo de lhe responder, ela me serve.
Referência:
RÍOS, Alberto. Nani. In: MAYES,
Frances. The discovery of poetry: a field guide to reading and writing
poems. 1st Harvest ed. San Diego, CA: Harvest & Harcout, 2001. p. 162-163.
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