Alpes Literários

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UM PASSEIO PELOS ALPES LITERÁRIOS

sábado, 1 de maio de 2021

Rosario Castellanos - Meditação no umbral

A rememorar incidentes biográficos de famosas figuras femininas, reais ou literárias, a poetisa mexicana postula por uma alternativa não partilhada por nenhuma das mencionadas mulheres, a saber, alternativa essa que se consagre a libertá-las dos jugos que a sociedade lhes impõe, um outro modo de ser que não seja o suicídio ou o enclausuramento.

 

Liberdade é poder escolher a vida que se deseja viver, sem pressões descabidas de terceiros, sem condicionantes impostas, assumindo, por outro lado, os efeitos e os encargos de suas próprias escolhas: violências descabidas, matrimônios indesejados ou sob coação, exercício da literatura sob pseudônimos masculinos etc. são o lado reverso da moeda, por meio da qual, muito mais ontem do que hoje, procurava-se pautar o mundo feminino de fora para dentro.

 

Sem embargo, para elas, ainda há um longo caminho a percorrer, especialmente no domínio do trabalho, no qual são palpáveis as diferenças salariais em favor dos homens, mesmo sob condições “tudo o mais constante” – a exemplo do nível educacional e da disponibilidade laboral –, com o que se cogita de circunstâncias reveladoras de discriminações obscenas, porque abstrusas.

 

J.A.R. – H.C.

 

Rosario Castellanos

(1925-1974)

 

Meditación en el umbral

 

No, no es la solución

tirarse bajo un tren como la Ana de Tolstoi

ni apurar el arsénico de Madame Bovary

ni aguardar en los páramos de Ávila la visita

del ángel con venablo

antes de liarse el manto a la cabeza

y comenzar a actuar.

 

Ni concluir las leyes geométricas, contando

las vigas de la celda de castigo,

como lo hizo Sor Juana. No es la solución

escribir, mientras llegan las visitas,

en la sala de estar de la familia Austen

ni encerrarse en el ático

de alguna residência de la Nueva Inglaterra

y soñar, con la Biblia de los Dickinson,

debajo de una almohada de soltera.

 

Debe haber otro modo que no se llame Safo

ni Mesalina ni María Egipciaca

ni Magdalena ni Clemencia Isaura.

 

Otro modo de ser humano y libre.

 

Outro modo de ser.

 

Homem com um machado

(Eric Aho: pintor norte-americano)

 

Meditação no umbral

 

Não, a solução não é

atirar-se sob um trem, como a Ana de Tolstói,

nem sorver o arsênico de Madame Bovary,

nem aguardar nos páramos de Ávila a visita

do anjo com venábulo,

antes de atar o manto à cabeça

e começar a agir.

 

Nem deduzir as leis da Geometria, contando

as vigas da cela de penitência,

como o fez Sóror Juana. Não é a solução

escrever, enquanto chegam os visitantes,

na sala de estar da família Austen,

nem trancar-se no sótão

de alguma residência da Nova Inglaterra

e sonhar, com a Bíblia dos Dickinson,

sob um travesseiro de solteira.

 

Deve haver outro modo que não se chame Safo,

nem Messalina, nem Maria Egipcíaca,

nem Madalena, nem Clemência Isaura.

 

Outro modo de ser humano e livre.

 

Outro modo de ser.

 

Referência:

 

CASTELLANOS, Rosario. Meditación en el umbral. In: __________. Meditation on the threshold. A bilingual edition: Spanish x English. Translation and introduction by Julian Palley. Tempe, AZ: Bilingual Press / Editorial Bilingüe, 1988. p. 48.

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