Hopkins revela neste soneto a intenção de compreender o papel que Deus exerce em sua vida, ele que, como qualquer humano, questiona a sua fé, mesmo pertencendo à Companhia de Jesus – o que, sob uma mirada externa, talvez suscitasse alguma perplexidade: apelos sem resposta deixam-no prostrado e num estado depressivo.
O falante conclui, de todo modo, que, acreditando em Deus, encontra-se em situação melhor que a daqueles que não o conhecem ou o recusam. Afinal, colhe-se o que se planta, e na visão de Hopkins, para os “perdidos” não há chances de redenção, motivo por que persistirão sob o metafórico manto da escuridão e do desterro.
J.A.R. – H.C.
Gerard Manley Hopkins
(1844-1889)
I wake and feel the
fell of dark
I wake and feel the fell of dark, not day.
What hours, O what black hours we have spent
This night! what sights you, heart, saw; ways you
went!
And more must, in yet longer light’s delay.
With witness I speak this. But where I say
Hours I mean years, mean life. And my lament
Is cries countless, cries like dead letters sent
To dearest him that lives alas! away.
I am gall, I am heartburn. God's most deep decree
Bitter would have me taste: my taste was me;
Bones built in me, flesh filled, blood brimmed the
curse.
Selfyeast of spirit a dull dough sours. I see
The lost are like this, and their scourge to be
As I am mine, their sweating selves; but worse.
Honfleur
(Claude Monet: pintor francês)
Desperto e sinto o assento da treva
Desperto e sinto o assento da treva, não dia.
Que horas, que horas negras esta noite sentiu,
Coração! que prantos viu, e que vias seguiu!
Mais deve devir, que a luz é mais, mais tardia.
Falo com testemunha. E as horas que eu dizia
Valem anos, valem vida. Meu clamor frio
É grito sem conta, carta morta de envio
Ao ele-amor que está, ai!, onde nunca o veria.
Sou fel, sou ácido-azia. Por Deus foi posto
Que tudo me seria amargo: eu era o gosto;
Carne-osso e sangue me trazem o mal maior.
Meu ser-fermento a má massa azeda. Meu rosto
Vê que os perdidos são assim, seu flagelo imposto
É como o meu, seu ser que sua; mas pior.
Referência:
HOPKINS, Gerald Manley. I wake and feel
the fell of dark / Desperto e sinto o assento da treva. Tradução de Luís
Gonçales Bueno de Camargo. In: CAMARGO, Luís Gonçales Bueno de. Tradução
comentada da poesia e da prosa de Gerard Manley Hopkins. Campinas, SP:
Unicamp – Instituto de Estudos da Linguagem, 1993. Em inglês: p. 150; em português:
p. 151. (Dissertação de Mestrado). Disponível neste endereço. Acesso em: 25 mar.
2021.
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