Numa perambulação de “turistas” fantasmagóricos a um “lugar sagrado” – a mais aparentar ser um vale pedregoso e pouco arejado – talvez, até mesmo uma espécie de necrópole –, o poeta invoca à virginal “Cecília” (Santa Cecília?), para que, com sua presença, silencie um sino troante que acabara de derrubar “as fortes defesas da idade e da inocência”.
Cecília, a repousar em sono eterno, transfigura-se agora em náiade, mais especificamente uma potâmide, com a missão – se, literalmente, náiade for – de cura e de poder oracular, ou, mais extensivamente, de conceder aos homens o natural talento para a poesia: em gratidão, o poeta leva-a a divisar as abelhas que, naquelas paragens, tornaram a revoar, a estenderem-lhe o mel como oferenda.
J.A.R. – H.C.
Herbert Read
(1893-1968)
Tourists in a sacred place
A pallid rout stepping like phantoms
beneath the arching boughs,
have come with angel hands and wretched voices
to the valley and this choir of perished stones.
Valid was my anguish – as though a turbulent dove
had scattered the leafy silence.
Now in airless vistas, dim and blind my limbs will
loiter
while the senses stray to vast defeats.
A rocking bell
peals in a gray tower.
The sound has broken down the strong defenses
of age and innocence.
Cecily come with your virginal tremors,
Cecily still the bell.
Your tresses are wet from the rushing river,
a green weed clings like a vein on your breast.
Cecily, listen, the clangor is over
now only the burden of bees in the clover.
God and his angels have given you grace,
and stamped your mission on your naiad face.
Muçulmanos nas Filipinas
(Abdulmari Asia Imao: artista filipino)
Turistas num lugar sagrado
Um pálido grupo, caminhando como fantasmas
sob os ramos arqueados,
chegou com mãos de anjo e péssimas vozes
ao vale e a este coro de pedras arruinadas.
Válida era minha angústia – como se uma pomba
turbulenta
houvesse dispersado o frondoso silêncio.
Agora em cenários sem ar, fuscos e cegos meus
membros vagarão
enquanto os sentidos se desviarem para vastas
derrotas.
Um sino oscilante
repica numa torre cinzenta.
O som derrubou as fortes defesas
da idade e da inocência.
Cecília, vem com teus virginais tremores,
Cecília, silencia o sino.
Tuas tranças estão úmidas do rio impetuoso,
um mato verde agarra-se a teu peito, como veia.
Ouve, Cecília, agora que o repique já está findo,
as abelhas no trevo o seu refrão zumbindo.
Deus e seus anjos deram-te atração,
e em teu rosto de náiade gravaram-te a missão.
Referência:
READ,
Herbert. Tourists in a sacred place / Turistas num lugar sagrado. Tradução de
Péricles Eugênio da Silva Ramos. In: CHAUCER, Geoffrey et al. Poetas da
Inglaterra. Edição bilíngue. Tradução e notas de Péricles Eugênio da Silva
Ramos em colaboração com Paulo Vizioli. São Bernardo do Campo, SP: Secretaria
da Cultura, Esporte e Turismo do Estado de São Paulo; Bandeirante S. A.
Indústria Gráfica, dez. 1970. Em inglês: p. 318; em português: p. 319.
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