Hoje, dia dedicado às mães, trago aos internautas um poema do poeta germano-israelense Yehuda Amichai, vertido ao português a partir da tradução ao inglês do original em hebraico, tal como o transcrevo e o referencio mais abaixo: a imagística e as alusões do poeta, em seus versos, muito se ajustam à sua primigênia cultura judaica.
Amorosa, atenciosa e prestimosa, a mãe do poeta muito se parece com as demais mães sobre a face da terra. Mas há nela uma particular apreensão: suas súplicas, mãos levantadas aos céus e devoção ao Eterno ecoam algo ingênuas diante dos perigos suscitados pela contemporânea realidade secularizada, a expor a vida do filho a riscos, em face da realidade vivenciada por Israel, sempre em guerras e contendas com os países vizinhos.
J.A.R. – H.C.
Yehuda Amichai
(1924-2000)
To My Mother
1
Like an old windmill
Two hands always raised
To howl at the sky
And two lowered
To make sandwiches.
Her eyes are clean and glitter
Like the Passover eve.
2
At night she will put
All the letters
And the photographs
Side by side.
So she can measure
The length of God’s finger.
3
I want to walk in the deep
Wadis between her sobs
I want to stand in the terrible heat
Of her silence.
I want to lean on the
Rough trunks
Of her pain.
4
She laid me,
As Hagar laid Ishmael
Under one of the bushes.
So that she won’t have to be at my
death
ln the war,
Under one of the bushes
In one of the wars.
Mãe e Filho
(Thomas Sully: pintor anglo-americano)
À Minha Mãe
1
Como um velho moinho de vento
Duas mãos sempre levantadas
A suplicar aos céus
E duas abaixadas
Para fazer sanduíches.
Seus olhos estão limpos e lustrosos
Como a véspera da Páscoa.
2.
Ao anoitecer disporá
Todas as cartas
E fotografias
Lado a lado.
Para que possa medir
A extensão do dedo de Deus.
3.
Quero caminhar por ravinas
Profundas entre seus soluços
Quero resistir à ardente efusão
De seu silêncio.
Quero me apoiar
Nos lenhos ásperos
De sua dor.
4.
Ela me pôs
Como Agar a Ismael (*)
Sob um dos arbustos.
Que não presencie minha morte
Em combate,
Sob um dos arbustos
Em uma das guerras.
Nota:
(*) Alusão a Agar, mãe de Ismael, que, ao ser expulsa da presença de Abraão em razão dos ciúmes de Sara, sua senhora, “partiu, andando errante no deserto de Berseba. E consumida a água do odre, lançou o menino debaixo de uma das árvores. E foi assentar-se em frente, afastando-se à distância de um tiro de arco; porque dizia: Que eu não veja morrer o menino. E assentou-se em frente, e levantou a sua voz, e chorou”. (Gênesis 21:14-16)
Referência:
AMICHAI, Yehuda. To my mother. In:
__________. Selected poems. Translated by Assia Gutmann and Harold
Schimmel with the collaboration of Ted Hughes. With an Introduction by Michael
Hamburger. Harmondsworth, EN: Penguin Books, 1971. p. 53-54. (‘Penguin Modern
European Poets’)
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