Alpes Literários

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UM PASSEIO PELOS ALPES LITERÁRIOS

quarta-feira, 14 de outubro de 2020

Yusef Komunyakaa - Noite do tatu

Pelo modo como se expressa neste poema, o ente lírico, aparentemente, emprega uma homologia à conduta de um armadilho – esquivo e protegido por uma “armadura” −, para transportá-la à esfera do comportamento humano: somos expostos aos “atrativos” com que uma sociedade de consumo busca nos cooptar, vencendo resistências e nos tornando conformistas.

O “armadilho” sofre as consequências do “sonho americano”, sempre a veicular as possibilidades de profecias que, ao fim e ao cabo, se mostram falsas. E, apenas por sorte, ainda não foi varrido do mapa pelos caminhões de entrega, embora os efeitos danosos desse padrão de vida sejam ostensivos em seu corpo – unhas, entranhas e “dobradiças”.

J.A.R. – H.C.

Yusef Komunyakaa
(n. 1947)

Night of the armadillo

You huddle into a shield or breastplate,
a whisper in the dark summoning your kin
one by one along the frontier. In your kingdom,
errant knight of undergrowth, even in your gut
fear, you’re always on the verge of a new border
or at the edge before crossing into the interior
of false prophecies. Desert blooms or berries
fall into marshy hush. Around a sharp curve
planetary lights spring out of nothingness.
How did you go wrong? With only blind faith
& a dead star left in your eyes, where’s North
America? You’ve been around eons,
not knowing when you’ve left one age
& entered another, but I found your Olympus
of foolish odds in the modern world.
Lovers in cars, delivery trucks make leaves
tremble along the roadside. If you know this,
little suitcase of guts & nails,
you are still alive,
even with your broken hinges.

Reflexos no Tatu
(Carlin Blahnik: pintora norte-americana)

Noite do tatu

Você se aloja numa toca ou armadura,
um sussurro na noite convocando os seus pares
um a um ao longo da fronteira. No seu reino,
cavalheiro errante do mato, até em seu temor
mais íntimo, você está sempre à beira de um novo limite
ou prestes a alcançar o interior
de falsas profecias. O deserto floresce e as amoras
caem num silêncio lodoso. Em torno de uma curva brusca
luzes planetárias surgem do nada.
No que você pecou? Apenas com sua fé cega
& uma estrela morta nos olhos, onde fica a América
do Norte? Você vem atravessando eras,
sem saber quando saiu de uma época
& entrou em outra, mas eu encontrei o seu Olimpo
de coisas insignificantes no mundo moderno.
Amantes nos carros, caminhões de entrega fazem as folhas
tremerem à beira da estrada. Se você sabe disso,
pequena mala de entranhas & unhas,
é porque ainda está vivo,
mesmo com as suas dobradiças quebradas.

Referência:

KOMUNYAKAA, Yusef. Night of the armadillo / Noite do tatu. Tradução de Flávia Rocha. In: Revista Brasileira. Academia Brasileira de Letras, Rio de Janeiro. Fase IX, Jan-Fev-Mar.2018, Ano I, n. 94. Em inglês: p. 250; em português: p. 251. Disponível neste endereço. Acesso em: 30 set. 2020.

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