Alpes Literários

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UM PASSEIO PELOS ALPES LITERÁRIOS

quinta-feira, 15 de outubro de 2020

Gabriel Celaya - Poesia, Sociedade Anônima

Com um título que bem resume o que lhe vai nos versos, este poema de Celaya discorre sobre o empreendimento poético enquanto construção coletiva, em que uns parodiam e/ou sobrepõem glosas a ideias de outros que lhes antecederam, exegese que se convalida nas asserções levantadas pelo crítico literário norte-americano Harold Bloom (1930-2019), em sua obra “A Angústia da Influência: uma teoria da poesia”, de 1973.

Aliás, a própria poesia pode ser objeto de poesia – como exemplos vários já postados neste blog −, mesclando-se “anonimamente” ao enorme acervo de valores que postulam transformar o estado de consciência dos leitores em relação ao mundo que os cerca, ora formulando de outro modo estados, físicos ou mentais, vezes sem conta já apreendidos pela palavra, outras tantas a exibir o engenho da inventividade, da criatividade, da fecundidade imaginosa do espírito humano.

J.A.R. – H.C.

Gabriel Celaya
(1911-1991)

Poesía, Sociedad Anónima

Como yo no soy yo, represento a cualquiera
y le presto mi voz a quien aún no la tenga;
o repito otras voces que siento como mías
aunque, hasta sin querer, siempre de otra manera.

Parezco personal, mas digo lo sabido
por otros hace siglos. O quizás, ayer mismo.
Ojalá me repitan sin recordar quien fui
como ahora yo repito a un anónimo amigo.

¡Oh futuro perfecto! No hay otra permanencia
que la de ser un eco corregido por otros
que no sabrán mi nombre, ni − espero − mi aventura.
Tampoco yo sé bien quién habla en mi conciencia.

Si algún día un muchacho nos plagia sin saberlo
y en él, lo ya sabido, vuelve a ser un invento,
estaremos en él, invisibles, reales,
como otros, ahora en mí, son corazón de un ave.

Es eso, y no los versos guardados en los libros,
lo que, venciendo el tiempo, sin forma durará
en la obra colectiva y anónima, aún en ciernes,
transformando y creando conciencia impersonal.

De: “Operaciones poéticas” [(1969-1971) 1971]

Memórias de ossos e árvores 2
(tamanho menor)
(Sheryl Parsons: artista canadense)

Poesia, Sociedade Anônima

Como eu não sou eu, represento qualquer um
e empresto a minha voz a quem ainda não a tenha;
ou repito outras vozes que sinto como minhas,
embora, mesmo sem querer, sempre de outra maneira.

Pareço pessoal, mas digo o que os outros
já sabiam há séculos. Ou, talvez, apenas ontem.
Oxalá me repitam sem recordar quem fui,
como agora eu repito um amigo anônimo.

Oh, futuro perfeito! Não há outra permanência
que a de ser um eco corrigido por outros
que não saberão meu nome, nem – espero – minha aventura.
Tampouco sei bem quem fala em minha consciência.

Se algum dia um menino nos plagia sem o saber
e, a bem dizer, o já sabido volta a ser um invento,
nele estaremos, invisíveis, reais,
como outros, agora em mim, são o coração de um pássaro.

É isso, e não os versos guardados nos livros,
o que, vencendo o tempo, perdurará sem forma
na obra coletiva e anônima, ainda em germinação,
transformando e criando consciência pessoal.

De: “Operações poéticas” [(1969-1971) 1971]

Referência:

CELAYA, Gabriel. Poesía, sociedade anónima. In: __________. Antología poética. Edición de A. Chicharro Chamorro. Madrid, ES: Alhambra Editorial, 1990. p. 131.

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