Alpes Literários

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UM PASSEIO PELOS ALPES LITERÁRIOS

domingo, 25 de outubro de 2020

José Régio - Natureza

Como se uma manifestação da natureza fosse, os versos do poeta trazem ao leitor, de fato, a poesia presente na criação, desde o ponto mesmo em que o material orgânico se recompõe para eclodir do caos primordial, até o instante decisivo e sublime em que a flor – como o poema – paira em sua beleza, aos olhos do observador atento.

Pressente-se alguma influência de Fernando Pessoa (1888-1935) nos versos de José Régio, a exemplo, talvez, de certas inflexões em poemas de Alberto Caeiro ou mesmo de Ricardo Reis: são ponderações metapoéticas lavradas em versos rimados, repletas daquela força que eclode de quando em vez nos poetas, capaz de assemelhar o resultado da intelecção a uma potência natural.

J.A.R. – H.C.

José Régio
(1901-1969)

Natureza

Meus versos que afinal sois naturais
Como as rosas, os montes, as nascentes,
De que abismos chegais?
Desceis de que vertentes?

E as cândidas de neve ou rubras como lume
Naturais rosas dos poetas,
Mergulham em que estrume
As raízes secretas?

De monte em monte o eco se responde
Dos montes naturais por i além.
Vai extinguir-se, aonde?
Vem, donde vem?

As águas naturais que entre granitos
À luz afloram,
Por que arrastam cadáveres, detritos,
E sobre lodo cantam, choram?

Sou eu que vos componho, ou vós que me criais,
Meus versos hoje nus e secos,
Meus versos que afinal sois naturais,
− Rosas e estrume, águas e lodo, montes, ecos...?

A tentação de Santo Antônio
(Dorothea Tanning: artista norte-americana)

Referência:

RÉGIO, José. Natureza. In: __________. Antologia. Rio de Janeiro, RJ: Nova Fronteira, 1985. p. 204.

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