Como se uma manifestação da natureza
fosse, os versos do poeta trazem ao leitor, de fato, a poesia presente na
criação, desde o ponto mesmo em que o material orgânico se recompõe para eclodir
do caos primordial, até o instante decisivo e sublime em que a flor – como o
poema – paira em sua beleza, aos olhos do observador atento.
Pressente-se alguma influência de Fernando
Pessoa (1888-1935) nos versos de José Régio, a exemplo, talvez, de certas
inflexões em poemas de Alberto Caeiro ou mesmo de Ricardo Reis: são ponderações
metapoéticas lavradas em versos rimados, repletas daquela força que eclode de
quando em vez nos poetas, capaz de assemelhar o resultado da intelecção a uma
potência natural.
J.A.R. – H.C.
José Régio
(1901-1969)
Natureza
Meus versos que
afinal sois naturais
Como as rosas, os
montes, as nascentes,
De que abismos
chegais?
Desceis de que
vertentes?
E as cândidas de neve
ou rubras como lume
Naturais rosas dos
poetas,
Mergulham em que
estrume
As raízes secretas?
De monte em monte o
eco se responde
Dos montes naturais
por i além.
Vai extinguir-se,
aonde?
Vem, donde vem?
As águas naturais que
entre granitos
À luz afloram,
Por que arrastam
cadáveres, detritos,
E sobre lodo cantam,
choram?
Sou eu que vos
componho, ou vós que me criais,
Meus versos hoje nus
e secos,
Meus versos que
afinal sois naturais,
− Rosas e estrume,
águas e lodo, montes, ecos...?
A tentação de Santo
Antônio
(Dorothea Tanning:
artista norte-americana)
Referência:
RÉGIO, José. Natureza. In: __________. Antologia.
Rio de Janeiro, RJ: Nova Fronteira, 1985. p. 204.
❁
Nenhum comentário:
Postar um comentário