O poeta se penitencia por haver destruído, há alguns anos, os pudores e
a timidez de que se cobria a amante, por nisso haver certo encanto, não como
agora, que as coisas já estão mais sedimentadas e despir-se frente ao parceiro
já se tornou algo habitual e sem constrangimentos, quando ambos se propõem a
viajar até os domínios do êxtase sexual.
É que o avançar do quotidiano acaba por descortinar, possibilitar à
visão, quaisquer outras realidades antes complementadas pela imaginação, um
elemento primordial no jogo erótico. Se o leitor aceitar uma sugestão de
leitura sobre o tema, recomendaria a obra “A dupla chama: amor e erotismo”
(1993), do Nobel mexicano Octavio Paz, sempre uma referência de peso.
J.A.R. – H.C.
Paul Géraldy
(1885-1983)
Passé
Tu avais jadis,
lorsque je t’ai prise,
il y a trois ans,
des timidités, des
pudeurs exquises.
Je te les ai
désapprises.
Je les regrette à
présent.
À présent, tu viens,
tu te déshabilles,
tu noues tes cheveux,
tu me tends ton corps...
Tu n’étais pas si
prompte alors.
Je t’appelais: ma
jeune fille.
Tu t’approchais
craintivement.
Tu avais peur de la
lumière.
Dans nos plus grands
embrassements,
je ne t’avais pas
tout entière...
Je t’en voulais.
J’étais avide,
ce pauvre baiser trop
candide,
de le sentir répondre
au mien.
Je te disais, tu t’en
souviens:
“Vous ne seriez pas
si timide
si vous m’aimiez tout
à fait bien!...”
Et maintenant je la
regrette
cette enfant au front
sérieux,
qui pour être un peu
plus secrète
mettait son bras nu
sur ses yeux.
Esbelta no terraço
(Konstantin Razumov:
pintor russo)
Passado
Há três anos, quando
conheci você,
Tinham certo encanto
Essa timidez, esses
pudores que
Destruí não sei
porquê...
Hoje eu me arrependo
tanto.
Hoje você chega,
despe-se depressa,
Prende os seus
cabelos, dá-se toda a mim...
Você não era bem
assim.
Era somente uma
promessa.
Era arisca e fugindo
um pouco
Da luz brutal que
você vinha.
E, nos meus
transportes mais loucos,
Você não era toda
minha...
Eu odiava você. Eu
queria
Que o pobre beijo,
que era o seu,
Correspondesse bem ao
meu.
Você não se lembra?
eu dizia:
“Não, você não seria
assim
Se gostasse mesmo de
mim!...”
E agora eu choro a
cada passo
A menina de rosto
sério
Que para ter maior
mistério
Cobria os olhos com
seu braço.
Referência:
GÉRALDY, Paul. Passé / Passado. Tradução
de Guilherme de Almeida. In: ALMEIDA, Guilherme de (Seleção e tradução). Poetas de França. Prefácio de Marcelo
Tápia. 5. ed. São Paulo, SP: Babel, 2011. Em francês: p. 162; em português: p.
163.
❁
Nenhum comentário:
Postar um comentário