Alpes Literários

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UM PASSEIO PELOS ALPES LITERÁRIOS

sábado, 18 de julho de 2020

Alberto de Oliveira - Última Deusa

O poeta carioca julga que a poesia acabou por aportar em “terra alheia”, decerto porque o Modernismo fez terra arrasada do programa parnasiano a que ele tanto se devotara, com as suas regras de rigor estético, perfeição das formas, impessoalidade e valorização da cultura clássica – a arte pela arte, em suma –, passando a se postular o acesso ao Olimpo, agora, por um método mais liberado de amarras.

A poesia, assim, seria a “última deusa” que restou nos páramos das artes. E que deusa! A descrição que Alberto nos oferece no primeiro terceto do soneto desperta facilmente os sentidos, pois dela pode-se ouvir o marulhar do “ouro tinto”, vertendo-se em “cachoeiras” sobre o colo da deusa – embora se trate, de fato, de uma metáfora aos seus longos cabelos ondulados –, em conjugação com outras impressões visuais, atinentes aos efeitos de luz e cor.

J.A.R. – H.C.

Alberto de Oliveira
(1857-1937)

Última Deusa

Foram-se os deuses, foram-se, em verdade;
Mas das deusas alguma existe, alguma
Que tem teu ar, a tua majestade,
Teu porte e aspecto, que és tu mesma, em suma.

Ao ver-te com esse andar de divindade,
Como cercada de invisível bruma,
A gente à crença antiga se acostuma
E do Olimpo se lembra com saudade.

De lá trouxeste o olhar sereno e garço, (1)
O alvo colo onde, em quedas de ouro tinto,
Rútilo rola o teu cabelo esparso...

Pisas alheia terra... Essa tristeza
Que possuis é de estátua que ora extinto
Sente o culto da forma e da beleza.

Cupidos: alegoria da poesia
(François Boucher: pintor francês)

Nota:

(1) garço – diz-se do olho esverdeado ou verde-azulado; gázeo.

Referência:

OLIVEIRA, Alberto de. Última deusa. In: __________. Poesias. 2. ed. Rio de Janeiro, RJ: Agir, 1969. p. 26-27.

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