Com toda a carga simbólica de uma autêntica parábola – como as de Cristo
nos Evangelhos –, Milosz enfatiza o que se mostra diminuto, limitado, como os
epítetos relacionados à pequenez do mundo, mas um mundo circunscrito à
tendência humana em se separar dos outros, concentrando-se tão apenas no
destino de alguém ou, pelo menos, das pessoas que lhe são mais próximas.
Assim como os grãos da papoula acham-se ao redor de um único estilete,
ínfimos para os olhos de quem os contempla, a própria Terra, quando vista e
comparada à extensão do cosmos, acaba também por revelar uma dimensão relativa microscópica.
Nesse plano, deve o homem olhar a floresta sem descuidar das árvores que a
compõem, afastando de si qualquer pretensão de antropocentrismo em relação ao
universo em que imerso.
Há galáxias na corola da papoula, há vastidões infindas sobre a Terra,
outras galáxias ainda na imensidão do universo – e delas as crianças nem suspeitam
quando brincam no jardim. Somos como os grãos da papoula, presos a um único
baluarte que é a Terra: mas quantas dissensões entre esses grãos, quando se
trata de dividir os recursos que ela nos oferece, alguns julgando-se
privilegiados pelos mais disparatados e injustificados motivos, outros sem
nada!
Uma nota final: coincidência ou não, uma vez que o vocábulo “parábola”
acha-se deveras associado ao nome de Jesus, e o poeta polonês, ademais, vincula-o
à imagem de uma papoula, julgo não dispensável lembrar que muitos artistas,
sobretudo europeus, em séculos passados, pejavam os seus afrescos sobre a vida
de Cristo com papoulas, mesmo quando a cena retratava a Natividade – como
alegoria ao que haveria de ocorrer, no futuro, com a criança: o seu sacrifício
pelo e para os homens. Houve acaso na concatenação levada a efeito por Milosz? Talvez não!
J.A.R. – H.C.
Czeslaw Milosz
(1911-2004)
Przypowieść o maku
Na ziarnku maku stoi
mały dom,
Pieski szczekają na
księżyc makowy
I nigdy jeszcze tym
makowym psom,
Że jest świat
większy, nie przyszło do głowy.
Ziemia to ziarnko –
naprawdę nie więcej,
A inne ziarnka –
planety i gwiazdy.
A choć ich będzie
chyba sto tysięcy,
Domek z ogrodem może
stać na każdej.
Wszystko w makówce.
Mak rośnie w ogrodzie,
Dzieci biegają i mak
się kołysze.
A wieczorami, o
księżyca wschodzie
Psy gdzieś szczekają,
to głośniej, to ciszej.
Vaso com papoulas
(Ewa Bartosik:
artista polonesa)
Parábola sobre o grão de papoula
Fica a casinha no
grão de papoula,
Para a lua de papoula
latem os cachorros
E nunca pensaram os
cães de papoula
Que há um mundo maior
trás os morros.
A Terra não é mais
que um grão,
Astros, planetas são
outros grãozinhos,
E nem que sejam quase
um milhão,
Em cada cabe uma
casinha com hortinho.
E tudo está na cabeça
da papoula,
Que no jardim com os
passos balança.
E, vindo a noite,
quando a lua rola
Ladram os cães, ora
alto, ora manso.
Referência:
MILOSZ, Czeslaw. Przypowieść o maku / Parábola
sobre o grão de papoula. Tradução de Piotr Kilanowski. In: MENDONÇA, Vanderley
(Ed.). Lira argenta: poesia em
tradução. Edição bilíngue. São Paulo, SP: Selo Demônio Negro, 2017. Em polonês:
p. 332; em português: p. 333.
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