Homem do teatro, imprensa e TV, mineiro, Chrysóstomo nos oferece o pano
de fundo de sua poética, uma espécie de perscrutação da noite com o objetivo de
se descobrir, tal qual uma “nau florida”, as profundas claridades que nela
existem, metamorfoseando em outras tantas flores o passado que lhe parece sombrio.
Afirma ele “escutar” o tempo e o espaço, os quais perduram, o primeiro
em sua intocabilidade – afinal, não se resgata o tempo já manado –, e o
segundo, explicitamente manifesto na decantação do pó sobre a superfície das
coisas – fecundado, transfundido –, a impedir que o poeta, ainda que isolado, assimile
o “vazio”.
J.A.R. – H.C.
Antônio Chrysóstomo
(1940-1987?)
Poética
Anoiteço,
Em meu ser de pecado
Uma nau florida
Vai descobrindo claridades
profundas.
Pela metamorfose do
passado
E da noite palpável,
Flores vão se
projetando
E iluminando sombras
por que choro.
Escuto o tempo
Por momentos
perfilados:
Ele já possui
Dimensões do
intocável.
Escuto o espaço.
Isolo-me; não consigo
o vazio.
Somente o pó,
fecundado,
Se transfunde.
Flores selvagens com uma visão de Dublin Dunleary
(Andrew Nicholl:
pintor irlandês)
Referência:
CHRYSÓSTOMO, Antonio. Poética. In:
AYALA, Walmir (Seleção e Apresentação). A
novíssima poesia brasileira. V. II. Rio de Janeiro, GB: Cadernos
Brasileiros, 1965. p. 20.
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