A beleza serena da natureza, a respeitar um ciclo que coloca em
movimento ordens insuspeitas, associadas metaforicamente a um devir humano – da
juventude à velhice: a pomba que arquiteta o seu ninho, árvores silenciosas em
cujos ramos brotam e envelhecem folhas sem par, reflexo da nutrição propiciada
por suas medulas subterrâneas.
Saba descreve o cenário à volta, mas, decerto, introjeta sentimentos ou
pensamentos que derivam dos encantos que nele percebe: intuo que certa
melancolia lhe alcança ao perceber tanta beleza contingente, que certo dia
deixará de existir para outra sobrevir – assim ele próprio, com a nostalgia de
seus versos.
J.A.R. – H.C.
Umberto Saba
(1883-1957)
Alberi
La colomba che preda
la festuca
e la porta nel nido
invidio, e voi
alberi silenziosi, a
cui le foglie,
ben disegnate, indora
il sole; belli
come bei giovanetti o
vecchi ai quali
la vecchiezza è un
aumento. Chi vi guarda
– verdi sotto una
nera ascella frondi
spuntano; alcuni rami
sono morti –
le vostre dure
sotterranee lotte
non ignora; la vostra
pace ammira,
anche più vasta.
E a voi ritorna,
amico;
laghi d’ombra nel
cuore dell’estate.
In: “Ultime cose” (1935-1943)
Igreja de Stanmer (Sussex)
(John Martin: pintor
inglês)
Árvores
Invejo a pomba que
apresa a palha
e a leva ao ninho, e
invejo a vós, também,
silentes árvores, a
cujas folhas
bem desenhadas
redoura o sol; belas
quais jovens belos,
ou velhos aos quais
a velhice enriquece.
Quem vos olha
– verdes na axila
negra onde a folhagem
desponta; alguns
ramos estão mortos –
a vossa dura luta
subterrânea
não ignora; a vossa
paz admira,
ainda mais vasta.
E a vós retorna,
amigo;
lagos de sombra em
pleno verão.
Em: “Últimas cosias” (1935-1943)
Referência:
SABA, Umberto. Alberi / Árvores.
Tradução de Geraldo Holanda Cavalcanti. In: Umberto Saba: poemas selecionados
(e traduzidos). Seleção e tradução de Geraldo Holanda Cavalcanti. Revista Brasileira. Academia Brasileira
de Letras; fase VII; out-nov-dez 2006; ano XIII; nº 49; p. 217-251. Em
italiano: p. 248; em português: p. 249. Disponível neste endereço. Acesso em: 10 mai.
2019.
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