Decepção, frustração, fracasso, desapontamento: é disso que trata o
poema de hoje, de como o sentimento leva a pessoa para baixo, quando deixamos
de realizar um de nossos diletos desejos, ou melhor, quando a conquista de algo
que poderia nos tornar, por exemplo, independentes financeiramente – como um emprego
– ficou ao largo, e só nos resta contemplar a natureza com as suas belezas
transitórias.
O emprego da palavra “religioso”, no primeiro verso, suscitou-me dúvidas
quanto ao sentido que o poeta pretendeu-lhe atribuir: seria porque, no contexto
bíblico, esse sentimento teria sido o mais notório entre os judeus, um povo
oprimido que nos legou muitas das alegorias que, ainda hoje, povoam a concepção
imaginária e mítica do homem ocidental?!
J.A.R. – H.C.
Tony Hoagland
(1953-2018)
Disappointment
I was feeling pretty religious
standing on the
bridge in my winter coat
looking down at the
gray water:
the sharp little
waves dusted with snow,
fish in their tin
armor.
That’s what I like
about disappointment:
the way it slows you
down,
when the querulous
insistent chatter of desire
goes dead calm
and the minor
roadside flowers
pronounce their quiet
colors,
and the red dirt of
the hillside glows.
She played the flute,
he played the fiddle
and the moon came up
over the barn.
Then he didn’t get
the job, –
or her father died
before she told him
that one, most
important thing –
and everything got
still.
It was February or
October
It was July
I remember it so
clear
You don’t have to
pursue anything ever again
It’s over
You’re free
You’re unemployed
You just have to
stand there
looking out on the
water
in your trench coat
of solitude
with your scarf of
resignation
lifting in the wind.
Na terra do algodão
(Barbara Simmons:
pintora norte-americana)
Desapontamento
Sentia-me bastante
religioso
em meu capote de
inverno, quedo sobre a ponte,
olhando para baixo
até as águas cinzentas:
as pequenas e
resvaladiças ondas pulverizadas com neve,
peixes em suas estanhadas
carcaças.
Isso é o que me
agrada no desapontamento:
o modo como ele
refreia o passo de seja quem for,
quando a insistente e
fastidiosa garrulice do desejo
se apazigua
e as flores menores à
beira da estrada
pronunciam suas cores
suaves,
e brilha a terra
vermelha da encosta.
Ela tocava flauta,
ele violino
e a lua erguia-se por
cima do celeiro.
Então ele não
conseguiu o emprego, –
ou o pai dela faleceu
antes que ela lhe dissesse
aquela mais
importante coisa –
e tudo ficou parado.
Era fevereiro ou
outubro
Era julho
Lembro-me tão
claramente
Não tens que
continuar à procura de algo nunca mais
Acabou-se
És livre
Estás desempregado
Só tens que
permanecer ali
olhando em direção à
água
em teu sobretudo de
solidão
com teu cachecol de
resignação
agitando ao vento.
Referência:
HOAGLAND, Tony. Disappointment. In:
KEILLOR, Garrison (Selection and Introduction). Good poems for hard times. New York, NY: Penguin Books, 2006. p.
113-114.
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