A discorrer sobre o conteúdo e a forma do poema, Mattoso formula uma
síntese do que deve haver em todas as criações poéticas para que o resultado
satisfaça o autor, tanto quanto o leitor: segundo ele, há “química” no verso,
não “dom”, talvez com isso querendo afirmar que o poema é mais um esforço
deliberado de compor versos com palavras adequadas e bem ajustadas, do que o
efeito de um dom inato, restrito a apenas alguns.
Afirma-se, no soneto, que a partir do que se define como poesia se traça
a trajetória de cada poeta, isto é, abraçado a uma espécie de programa
previamente delimitado, toma o poeta um determinado rumo, como no caso das várias
escolas literárias, a exemplo dos modernistas – rompendo com a métrica do verso
–, e seus inúmeros consectários, como no caso dos concretistas.
J.A.R. – H.C.
Glauco Mattoso
(n. 1951)
Soneto Sintético
De como a poesia é
definida
depende a trajetória
do poeta.
Qual é, pergunto, a
fórmula secreta
que traça em poucas
linhas uma vida?
Segundo Rilke, a lira
não duvida.
mas Eliot é turrão, e
tudo objeta.
Bashô quanto mais crê
menos se aquieta.
Pessoa diz que é fé
na dor fingida.
Divergem tantos
mestres só no tom.
Não há por que dar
tratos ao bestunto:
há química no verso,
não um dom.
Qualquer opinião,
qualquer assunto
será, verdade ou não,
poema bom
se for densa a
fração, breve o conjunto.
Em: “Panaceia” (2000)
Os Poetas
(Renato Birolli:
pintor italiano)
Referência:
MATTOSO, Glauco. Soneto sintético. In:
ASCHER, Nelson et al. Poetas na
biblioteca: antologia. São Paulo, SP: Fundação Memorial da América Latina,
2001. p. 111.
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