O ente lírico sente-se enredado num labirinto em sua vida neste planeta,
e constata que nem um Deus supremo – como o Zeus grego – seria capaz de desvencilhá-lo
desse dédalo que o faz percorrer noites e dias para se aproximar da sombra de
um outro – que também é ele mesmo – vindo este das regiões de Hades, vale
dizer, do reino dos mortos.
Esse híbrido que muitos já fora – sorvendo vidas e vidas a cada ano –, mas
de cuja memória deslembrou, vivencia tal singular experiência de solidão como
uma armadilha do destino, trancafiado no tempo e no espaço: pobre Minotauro a
expiar a culpa dos fatos desditosos de sua origem...
J.A.R. – H.C.
Jorge Luis Borges
(1899-1986)
El Laberinto
Zeus no podría
desatar lãs redes
de piedra que me
cercan. He olvidado
los hombres que antes
fui; sigo el odiado
camino de monótonas
paredes
que es mi destino.
Rectas galerías
que se curvan en
círculos secretos
al cabo de los años.
Parapetos
que ha agrietado la
usura de los días.
En el pálido polvo he
descifrado
rastros que temo. El
aire me ha traído
en las cóncavas
tardes un bramido
o el eco de un
bramido desolado.
Sé que en la sombra
hay Otro, cuya suerte
es fatigar las largas
soledades
que tejen y destejen
este Hades
y ansiar mi sangre y
devorar mi muerte.
Nos buscamos los dos.
Ojalá fuera
éste el último día de
la espera.
En: “Elogio de la Sombra” (1969)
Perdido no Labirinto
(Philip Arnzen-Jones:
pintor norte-americano)
O Labirinto
Nem Zeus desataria
essas redes
de pedra que me
cercam. Olvidado
dos homens que antes
fui, sigo o odiado
caminho de monótonas
paredes
que é meu destino.
Retas galerias
encurvando-se em
círculos secretos
com o passar dos
anos. Parapeitos
que se racharam na
usura dos dias.
Já decifrei no pó
esbranquiçado
rastros que temo. Tenho
percebido
no ar das côncavas
tardes um rugido
ou o eco de um rugido
desolado.
Sei que na sombra há
Outro, cuja sorte
é exaurir as solidões
sem fim
que este Hades fiam e
desfiam,
sugar meu sangue e
devorar minha morte.
Nós dois nos
procuramos. Quem me dera
fosse este o dia
último da espera.
Em: “Elogio da Sombra” (1969)
Referência:
BORGES, Jorge Luis. El laberinto / O
laritinto. Tradução de Josely Vianna Baptista. In: __________. Nova antología pessoal. Traduções de
Davi Arrigucci Jr., Heloisa Jahn e Josely Vianna Baptista. Edição bilíngue. 1.
ed. São Paulo, SP: Companhia das Letras, 2013. Em espanhol: p. 291; em
português: p. 27.
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