Alpes Literários

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UM PASSEIO PELOS ALPES LITERÁRIOS

sábado, 4 de maio de 2019

Charles Wright - Noite Clara

O céu começa a escurecer e a luz espreita a cena a partir de seu escaninho. E então o orador descreve como aspira a fazer parte desse panorama. O céu e o que tudo à volta se encontra parecem rejeitá-lo, continuando em seus ciclos com indiferença. É o que se depreende da segunda estrofe do poema: não estaria mais disponível ao autor a concretização de um desejo por transcendência, ainda que a busque pela aspereza divina.

Pergunto-me aqui entre os meus botões: será, de fato, que as coisas no universo transcorrem desse modo, assustadoramente indiferentes, mecânicas e destituídas de sentido? Teremos que dar vazão ao ceticismo frente ao sagrado e ao religioso? E essa dimensão religiosa tem, necessariamente, de perpassar pelo punitivismo e pela penitência? De todo modo, transformamo-nos em cada passo, muito embora nem sempre do modo como gostaríamos que ocorresse...

J.A.R. – H.C.

Charles Wright
(n. 1935)

Clear Night

Clear night, thumb-top of a moon, a back-lit sky.
Moon-fingers lay down their same routine
On the side deck and the threshold, the white keys
and the black keys.
Bird hush and bird song. A cassia flower falls.

I want to be bruised by God.
I want to be strung up in a strong light and singled out.
I want to be stretched, like music wrung from a
dropped seed.  
I want to be entered and picked clean.

And the wind says “What?” to me.
And the castor beans, with their little earrings of death,
say “What?” to me.
And the stars start out on their cold slide through the dark.  
And the gears notch and the engines wheel.

Uma Noite Clara
(Christine Wasankari: pintora norte-americana)

Noite Clara

Noite clara, a ponta de polegar de uma lua, um céu
iluminado por trás.
Os dedos lunares assentam a sua mesma rotina
Sobre a coberta lateral e a entrada, as teclas brancas
e as teclas pretas.
Há silêncio e canto de pássaros. Cai uma flor de cássia.

Quero ser fustigado por Deus.
Quero ser suspenso numa luz intensa e escolhido.
Quero ser estirado, como música despegada de uma
semente deixada cair.
Quero ser incluído e recolhido puro.

E o vento diz “o quê?” para mim.
E as mamoneiras, com seus pequenos e mortais brincos,
dizem-me “o quê?
E as estrelas começam a deslizar pelo céu frio e escuro.
E giram os dentes das engrenagens e as rodas dos motores.

Referência:

WRIGHT, Charles. Clear night. In: McCLATCHY, J. D. (Ed.). The vintage book of contemporary american poetry. 2nd ed. New York, NY: Vintage Books (A Division of Random House Inc.), march 2003. p. 393.

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