Embora repleto de menções a fenômenos da natureza – mar, rochedo,
árvore, pedra, vento etc. –, este poema, de fato, empreende um exame da jornada
filosófica empreendida pelo poeta – esposo de Sylvia Plath, no momento em que
esta decidiu suicidar-se –, como se estivesse a pesquisar pontos de explicação
para o seu próprio dilema existencial.
Enfatizo, por exemplo, o ponto em que se apresenta a metáfora de uma
árvore esforçando-se de qualquer maneira para manter-se viva em terreno
inóspito, em paralelo à menção de uma idosa que foi arremessada ao planeta não
se sabe exatamente por quem, cuja alma há muito partiu para outras paragens.
J.A.R. – H.C.
Comentário de Ted Hughes sobre “Pibroch”
Cada poeta tem
algumas intuições arraigadas, dons de sua natureza, que são como os dentes com
os quais se apropria do mundo. A maior parte deste trabalho é uma mastigação de
sua experiência casual. Porém escolho este poema por se parecer com um dos meus
dentes. Um ‘Pibroch’ é uma peça de música para gaita de foles, uma série de
variações ‘sobretudo marciais, embora também inclua canções fúnebres (endechas)’.
Nenhum som me atinge tão profundamente quanto o emitido por uma gaita de foles.
Supõe-se que um espírito familiar serve a uma dada família por gerações, e vejo
este poema como uma relíquia familiar. (ENGLE; LANGLAND, 1962, p. 288)
Ted Hughes
(1930-1998)
Pibroch
The sea cries with
its meaningless voice
Treating alike its
dead and its living,
Probably bored with
the appearance of heaven
After so many
millions of nights without sleep,
Without purpose,
without self-deception.
Stone likewise. A
pebble is imprisoned
Like nothing in the
Universe.
Created for black
sleep. Or growing
Conscious of the sun’s
red spot occaisionally,
Then dreaming it is
the foetus of God.
Over the stone rushes
the wind
Able to mingle with
nothing,
Like the hearing of
the blind stone itself.
Or turns, as if the
stone’s mind came feeling
A fantasy of
directions.
Drinking the sea and
eating the rock
A tree strugges to
make leaves –
An old woman fallen
from space
Unprepared for these
conditions.
She hangs on, because
her mind’s gone completely.
Minute after minute,
aeon after aeon,
Nothing lets up or
develops.
And this is neither a
bad variant nor a tryout.
This is where the
staring angels go through.
This is where all the
stars bow down.
Terra Devoluta
(Charles-François Daubigny: pintor francês)
Pibroch
Estronda o mar com
sua voz carente de sentido
A tratar
identicamente seus mortos e seus vivos,
Porventura entediado
com a aparência do céu,
Depois de tantos
milhões de noites sem dormir,
Sem um ocasional
propósito, sem autoengano.
Do mesmo modo a
pedra. Um seixo está preso
Como coisa que nada expressa
neste Universo,
Criado para um sonho obscuro.
Ou, por acaso,
Fazer-se consciente
da mancha vermelha do sol,
E daí a pouco vir a
sonhar que é o feto de Deus.
Sobre a face da pedra
dispara o vento
Capaz de se mesclar
com coisa alguma,
Como a escuta da
própria pedra cega.
Ou voluteia, como se
a alma da pedra
Se pudesse sentir num
delírio de rumos.
Tragando o mar e
devorando a rocha
Uma árvore ocupa-se
em criar folhas –
Como idosa que
despencou do espaço
Inadaptada a tais
condições. Se persiste,
É porque a alma há
muito lhe desertou.
Minuto seguido de
minuto, éon de éon,
E nada deixa-se ir ou
vem a se expandir,
Enquanto má variante
ou mesmo prova.
Eis o lugar
percorrido por anjos curiosos,
Ante o qual todas as
estrelas se curvam.
Referência:
HUGHES, Ted. Pibroch. In: ENGLE, Paul;
LANGLAND, Joseph (Eds.). Poets’ choice. New York, NY: The Dial Press, 1962. p. 287-288.
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