Alpes Literários

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UM PASSEIO PELOS ALPES LITERÁRIOS

quinta-feira, 10 de janeiro de 2019

Ted Hughes - Pibroch

Embora repleto de menções a fenômenos da natureza – mar, rochedo, árvore, pedra, vento etc. –, este poema, de fato, empreende um exame da jornada filosófica empreendida pelo poeta – esposo de Sylvia Plath, no momento em que esta decidiu suicidar-se –, como se estivesse a pesquisar pontos de explicação para o seu próprio dilema existencial.

Enfatizo, por exemplo, o ponto em que se apresenta a metáfora de uma árvore esforçando-se de qualquer maneira para manter-se viva em terreno inóspito, em paralelo à menção de uma idosa que foi arremessada ao planeta não se sabe exatamente por quem, cuja alma há muito partiu para outras paragens.

J.A.R. – H.C.

Comentário de Ted Hughes sobre “Pibroch”

Cada poeta tem algumas intuições arraigadas, dons de sua natureza, que são como os dentes com os quais se apropria do mundo. A maior parte deste trabalho é uma mastigação de sua experiência casual. Porém escolho este poema por se parecer com um dos meus dentes. Um ‘Pibroch’ é uma peça de música para gaita de foles, uma série de variações ‘sobretudo marciais, embora também inclua canções fúnebres (endechas)’. Nenhum som me atinge tão profundamente quanto o emitido por uma gaita de foles. Supõe-se que um espírito familiar serve a uma dada família por gerações, e vejo este poema como uma relíquia familiar. (ENGLE; LANGLAND, 1962, p. 288)

Ted Hughes
(1930-1998)

Pibroch

The sea cries with its meaningless voice
Treating alike its dead and its living,
Probably bored with the appearance of heaven
After so many millions of nights without sleep,
Without purpose, without self-deception.

Stone likewise. A pebble is imprisoned
Like nothing in the Universe.
Created for black sleep. Or growing
Conscious of the sun’s red spot occaisionally,
Then dreaming it is the foetus of God.

Over the stone rushes the wind
Able to mingle with nothing,
Like the hearing of the blind stone itself.
Or turns, as if the stone’s mind came feeling
A fantasy of directions.

Drinking the sea and eating the rock
A tree strugges to make leaves –
An old woman fallen from space
Unprepared for these conditions.
She hangs on, because her mind’s gone completely.

Minute after minute, aeon after aeon,
Nothing lets up or develops.
And this is neither a bad variant nor a tryout.
This is where the staring angels go through.
This is where all the stars bow down.

Terra Devoluta
(Charles-François Daubigny: pintor francês)

Pibroch

Estronda o mar com sua voz carente de sentido
A tratar identicamente seus mortos e seus vivos,
Porventura entediado com a aparência do céu,
Depois de tantos milhões de noites sem dormir,
Sem um ocasional propósito, sem autoengano.

Do mesmo modo a pedra. Um seixo está preso
Como coisa que nada expressa neste Universo,
Criado para um sonho obscuro. Ou, por acaso,
Fazer-se consciente da mancha vermelha do sol,
E daí a pouco vir a sonhar que é o feto de Deus.

Sobre a face da pedra dispara o vento
Capaz de se mesclar com coisa alguma,
Como a escuta da própria pedra cega.
Ou voluteia, como se a alma da pedra
Se pudesse sentir num delírio de rumos.

Tragando o mar e devorando a rocha
Uma árvore ocupa-se em criar folhas –
Como idosa que despencou do espaço
Inadaptada a tais condições. Se persiste,
É porque a alma há muito lhe desertou.

Minuto seguido de minuto, éon de éon,
E nada deixa-se ir ou vem a se expandir,
Enquanto má variante ou mesmo prova.
Eis o lugar percorrido por anjos curiosos,
Ante o qual todas as estrelas se curvam.

Referência:

HUGHES, Ted. Pibroch. In: ENGLE, Paul; LANGLAND, Joseph (Eds.). Poets choiceNew York, NY: The Dial Press, 1962. p. 287-288.

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