Como se estivesse produzindo uma síntese dos princípios do taoísmo,
segundo o qual tudo quanto existe expressa a influência de duas forças
fundamentais – o yin e o yang –, o poeta romeno vê nas coisas à volta mil
exteriorizações da realidade que, sob olhares distintos, deixam-no primeiramente alegre, depois triste.
Outro contraponto à ideia do poema que acorreu-me foram as meditações de
Marco Aurélio, o imperador romano e pensador estoico, com aquele matiz de
impassibilidade frente às ocorrências do mundo, quer alegres quer tristes. Diz
ele: “A morte e a vida, a boa e a má fama, o sofrimento e o prazer, a riqueza e
a pobreza, todas essas coisas ocorrem indistintamente aos homens, tanto aos
bons quanto aos maus, porque não são nem belas nem vergonhosas, tampouco boas ou
más”(*).
J.A.R. – H.C.
Marin Sorescu
(1936-1996)
De Două Ori
Mă uit la toate lucrurile
De două ori.
O dată ca să fiu vesel,
Și o dată ca să fiu trist.
Copacii au un hohot
de ras
În coroana de frunze
Și o lacrimă mare
În rădăcină.
Soarele e tânăr
În vârful razelor,
Dar razele lui
Sunt înfipte în
noapte.
Lumea se închide
perfect
Între aceste două coperți
Unde am îngrămădit toate lucrurile
Pe care le-am iubit
De două ori.
Melancolia
(Edvard Munch: pintor
norueguês)
Duas Vezes
Olho todas as coisas
duas vezes:
uma para ficar
alegre,
outra para ficar
triste.
As árvores têm um
alegre sorriso
na coroa de folhas
e uma grande lágrima
na raiz.
O sol é jovem
na ponta dos raios,
mas os seus raios
estão cravados na
noite.
O mundo se fecha
perfeitamente
entre estas duas
cobertas,
onde amontoei todas
as coisas
que amei
duas vezes.
Nota:
(*) Excerto final da lucubração nº 11
do Livro II de “Meditações”, de Marco Aurélio.
Referências:
Em Romeno
Em Português
SORESCU, Marin. Duas vezes. Tradução de
Luciano Maia. In: __________. Razão e coração:
poemas. Tradução de Luciano Maia. São Paulo, SP: Editora Giordano Ltda.;
Fortaleza, CE: Biblioteca ‘O Curumim Sem Nome’, 1995. p. 15.
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