O poeta canta loas ao cinema, naquilo que é capaz de enlevar o
telespectador, por imagens e por músicas, trazendo as mais diversas mensagens
em seu enredo – e é claro, não nos enganemos!, mesmo aquelas de cunho sub-reptício,
isto porque estamos falando de um dos principais produtos da denominada “indústria
cultural”.
Tem-se ainda a pontuar as limitações que a linguagem do cinema possui
frente à do texto literário: raras vezes as adaptações, para a grande tela, de renomadas
obras da literatura mundial resultam em filmes à altura da história em que se baseiam,
em razão, sobretudo, da escolha que os cineastas fazem das cenas “mais importantes”
das obras transpostas – eleição que, como se poderia suspeitar, passa pelo
domínio das idiossincrasias –, afinal, tudo deverá ser recontado num lapso
máximo de duas a três horas!
J.A.R. – H.C.
Edmundo de Bettencourt
(1889-1973)
Cinema
No meu olhar,
de gosto,
ritmo,
aroma
e seda,
com ele,
por mágica alameda
eu sonho ir ao espaço
das visões,
que rolam como os
mundos,
numa sagrada música
visível,
onde eu me
dispersaria...
Ó Cinema, ó maravilha
em que eu me
possuiria,
mas que apenas possuo
da sombra,
na viva solidão da
multidão quieta,
entre as carícias do
silêncio ao pensamento,
sem esforço levado
a sofrer, a sentir
o que de eterno há
num momento!
Em ti, a vida,
mais viva porquanto
mais alada
em fantasia livre,
sem noites e sem
dias,
brutal ou delicada,
é síntese movendo-se
em transcendência de
tristezas e alegrias,
numa calma final de
nuvens macias como penas,
que tempestades não
consomem,
de encontro ao
metálico recorte
das projecções
estéticas do homem!
Cinema!
mais que tudo, és
o que lá fora buscam
almas inquietas!
Mais que tudo, nos dás
o sonho que das almas
sobe
nas imagens dos
poetas!
Em: “O Momento e a Legenda” (1917-1930)
Lady Elizabeth Murray e Dido Elizabeth Belle
(Autoria
Desconhecida)
Referência:
BETTENCOURT, Edmundo de. Cinema. In:
__________. Poemas: 1930-1962.
Lisboa, PT: Portugália, dez/1963. p. 41-43. (Coleção ‘Poetas de Hoje’; v. 14)
❁
Nenhum comentário:
Postar um comentário