Alpes Literários

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UM PASSEIO PELOS ALPES LITERÁRIOS

quinta-feira, 24 de janeiro de 2019

Cesare Pavese - Trabalhar cansa

Há a expressão de um desejo neste poema de Pavese: o de ter alguém com quem possa compartilhar a jornada – por isso a procura por uma companheira numa “praça deserta”. Mas persiste, por trás de qualquer primeira impressão que os versos possam denotar, a sensação de que o poeta esteja mesmo é ratificando a tese de que o homem contemporâneo predispõe-se à solidão, haja vista que a sua existência é caracterizada por certo desconforto que, por vezes, o leva ao absurdo do suicídio – aliás, como o cometeu o próprio Pavese.

Esse homem que percorre as ruas o dia todo, depois de uma lida cansativa e taciturna, é a face oposta do menino, que “escapa de casa”, indolente que é, em fuga do trabalho para buscar o prazer da ociosidade. No retorno para casa, pergunta-se: “Vale a pena ser só para ser sempre mais só?”.

J.A.R. – H.C.

Cesare Pavese
(1908-1950)

Lavorare stanca

Traversare una strada per scappare di casa
lo fa solo un ragazzo, ma quest’uomo che gira
tutto il giorno le strade, non è più un ragazzo
e non scappa di casa.

Ci sono d’estate
pomeriggi che fino le piazze son vuote, distese
sotto il sole che sta per calare, e quest’uomo, che giunge
per un viale d’inutili piante, si ferma.
Val la pena esser solo, per essere sempre più solo?
Solamente girarle, le piazze e le strade
sono vuote. Bisogna fermare una donna
e parlarle e deciderla a vivere insieme.
Altrimenti, uno parla da solo. È per questo che a volte
c’è lo sbronzo notturno che attacca discorsi
e racconta i progetti di tutta la vita.

Non è certo attendendo nella piazza deserta
che s’incontra qualcuno, ma chi gira le strade
si sofferma ogni tanto. Se fossero in due,
anche andando per strada, la casa sarebbe
dove c’è quella donna e varrebbe la pena.
Nella notte la piazza ritorna deserta
e quest’uomo, che passa, non vede le case
tra le inutili luci, non leva più gli occhi:
sente solo il selciato, che han fatto altri uomini
dalle mani indurite, come sono le sue.
Non è giusto restare sulla piazza deserta.
Ci sarà certamente quella donna per strada
che, pregata, vorrebbe dar mano alla casa.

O Homem Solitário
(Munir Alawi: artista palestino)

Trabalhar cansa

Atravessar uma rua para escapar de casa
só o faz o menino, mas este homem que gira
o dia todo pelas ruas não é mais um menino
e não escapa de casa.

O verão tem tardes
que até as praças são vazias, vastas
sob o sol que vai se pondo, e este homem, que chega
por uma avenida de inúteis plantas, para.
Vale a pena ser só para ser sempre mais só?
Somente contorná-las, as praças e as ruas
estão vazias. É preciso abordar uma mulher
e falar-lhe e decidi-la a viver juntos.
De outro modo, se fala sozinho. É por isso que às vezes
se encontra o bêbado noturno que faz discursos
e conta os projetos da vida toda.

Não é certamente esperando na praça deserta
que se encontra alguém, mas quem gira pelas ruas
para de vez em quando. Se fossem em dois,
mesmo que andando pela rua, a casa seria
onde está aquela mulher e valeria a pena.
De noite, a praça volta a ser deserta
e este homem que passa não vê as casas
entre inúteis luzes, não ergue mais os olhos:
sente só o calçamento que fizeram outros homens
de mãos endurecidas como as suas.
Não é justo restar na praça deserta.
Existirá certamente aquela mulher pela rua
que se suplicada ajudaria em casa.

(Tradução publicada em “Folhetim” em 3.4.1983)

Referências:

Em italiano:

PAVESE, Cesare. Lavorare stanca. In: __________. Lavorare stanca. Torino, IT: Einaudi, 1977. p. 80-81.

Em Português

PAVESE, Cesare. Trabalhar cansa. Tradução de Maria Betânia Amoroso. In: SUZUKI JR., Matinas; ASCHER, Nelson (Organizadores). Folhetim: poemas traduzidos. São Paulo, SP: Folha de São Paulo, 1987. p. 158-159.

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