Qual o poeta que nunca teorizou sobre o seu próprio mister? Temos aqui o
espanhol Badosa a discorrer sobre o que lhe parece ser, em última instância, a
arte poética, uma recorrência sempre a levar em consideração o que se pode fazer
com as mãos, em especial, a inarredável hipótese de que nos permitem compulsar
os livros.
No derradeiro verso da sexta e última estrofe, o poeta vislumbra a
possibilidade de se envelhecer com “Deus entre as mãos” e, decerto, com isso, reporta-se
ao fato de que as pessoas mais velhas são as guardiãs dos livros sagrados, como
a Bíblia, da qual extraem prazer em leituras como as do Eclesiastes, do livro
da Sabedoria ou dos provérbios de Salomão.
J.A.R. – H.C.
Enrique Badosa
(n. 1927)
Arte Poética
...que dure más el arte
que la naturaleza.
Lope de Vega
Dibujar nuevas islas en
los mapas,
saber quedarse solo y
saber ir
junto con los demás,
y preguntarse
qué debemos hacer con
nuestras manos.
Escuchar lo que es
bueno y habla bien,
vivir la libertad con
los amigos
y poder, para
siempre, ser un hombre
que lleva un libro
abierto entre las manos.
Buscar con mis
palabras la palabra,
cansarme, levantarme
y merecer
el pan, la sal y el
agua cada dia,
y un justo bienestar
para otras manos.
Ganar el buen amor y
conversar,
tener silêncios
pulcros y leales,
y ser libres amando y
presintiendo
que los hijos nos
cogen de la mano.
Saber que no estoy
solo en la tristeza,
que tampoco estoy
solo en la alegria,
y que también a mí
puede alcanzarme
la mala soledad sobre
las manos.
Pensar constantemente
todo aquello
que ya no tendré
tiempo de escribir,
tomar un libro nuevo
y esperar
y envejecer, con Dios
entre las manos.
Mãos da Paz
(Dalene McIntosh:
pintora sul-africana)
Arte Poética
...que a arte dure mais
que a natureza.
Lope de Vega
Desenhar novas ilhas
nos mapas,
saber ficar sozinho e
saber ir
junto com os demais,
e perguntar-se
o que devemos fazer
com nossas mãos.
Escutar aquele que é
bom e fala bem,
viver a liberdade com
os amigos
e poder, para sempre,
ser um homem
que leva um livro
aberto entre as mãos.
Buscar com minhas
palavras a palavra,
cansar-me,
levantar-me e merecer
o pão, o sal e a água
de cada dia,
e um justo bem-estar
para outras mãos.
Ganhar o bom amor e
conversar,
ter silêncios limpos
e leais,
e ser livre amando e pressentindo
que os filhos nos levam
pela mão.
Saber que não estou
sozinho na tristeza,
que tampouco estou
sozinho na alegria,
e que também a má
solidão pode
vir a alcançar-me
pelas mãos.
Pensar constantemente
em tudo aquilo
que já não terei
tempo de escrever,
tomar um livro novo e
esperar
e envelhecer, com
Deus entre as mãos.
Referência:
BONALD, José Manuel Caballero. Arte
poética. In: MORALES, María Luz (Selección, prólogo y notas biográficas). Libro de oro de la poesía en lengua
castellana: España y América. Segunda parte: siglo XX. Tomo II. 2. ed.
Barcelona, ES: Editorial Juventud, 1984. p. 1275-1276. (‘Libros de Bolsillo Z’;
n. 179)
❁
Nenhum comentário:
Postar um comentário