Há certo confronto entre os termos empregados para se designar os poetas e os escritores, como se, ambos, não lançassem mão da palavra para veicular as ideias que lhe espicaçam a mente. Assim como percebo o problema, diria que todos são escritores, embora nem todos os escritores sejam poetas, obviamente.
Outro problema é se perceber a poesia como estrita a determinada conformação, como diria?, gráfica, feita de versos, carregada de figuras de linguagens – a metáfora em especial. Com efeito, qualquer tentativa de delimitar fronteiras entre prosa e poesia tende a gerar miríades de escólios para evidenciar distinções que resistem a quaisquer métodos ou sistemáticas.
Costumo afirmar que há mais poesia numa obra como “A Morte de Virgílio”, o famoso romance de Hermann Broch, do que em determinados livros de poemas que, de tão cerebrinos – haja vista as ponderações filosóficas, os raciocínios lógicos ou os dilemas éticos neles versados –, talvez merecessem mudar de estante nas bibliotecas, saindo da seção 800 para as seções 100 ou 200.
Mas deixemos de prosa! (rs). Veja, internauta, o que tem a dizer sobre a questão a premiada poetisa polonesa Szymborska, Nobel de Literatura em 1996.
J.A.R. – H.C.
Wisława Szymborska
(1923-2012)
Trema
Poeci i pisarze.
Tak się
przecież mówi.
Czyli poeci nie pisarze, tylko kto –
Poeci to poezja, pisarze to proza –
W prozie może
być wszystko, – również i poezja,
ale w poezji musi być tylko poezja –
Zgodnie z afiszem, który ją ogłasza
przez duże, z
secesyjnym zawijasem P,
wpisane w struny uskrzydlonej liry,
powinnam raczej wefrunąć niż wejść –
I czy nie lepiej boso,
niż w tych butach z Chełmka
tupiąc,
skrzypiąc
w niezdarnym zastępstwie
anioła –
Gdyby chociaż ta
suknia dłuższa, powłóczystsza,
a wiersze nic z torebki, ale wprost z rękawa,
od święta, od parady, od wielkiego dzwonu,
od bim do bum,
ab ab ba –
A tam na podium czyha już stoliczek
spirytystyczny jakiś, na złoconych nóżkach,
a na stoliczku kopci się lichtarzyk –
Z czego wniosek,
że będę musiała przy świecach
czytać to, co pisałam przy zwykłej żarówce
stuk stuk stuk na maszynie –
Nie martwiąc się zawczasu,
czy to jest poezja
i jaka to poezja –
Czy taka, w której proza widziana jest źle –
Czy taka, która dobrze jest widziana w prozie –
I co w tym za różnica,
wyraźna
już tylko w półmroku
na tle kurtyny bordo
z fioletowymi frędzlami?
Ensaio de balé no
palco
(Edgar Degas: pintor francês)
Medo do palco
Poetas e escritores.
É assim que se diz.
Logo, poetas não são escritores, então o quê –
Os poetas são poesia, os escritores são prosa –
Na prosa pode caber tudo, inclusive a poesia,
mas na poesia deve haver só poesia –
De acordo com o cartaz que a anuncia
com o floreio art
nouveau de um P maiúsculo,
inscrito nas cordas de uma lira alada,
eu deveria entrar voando, não andando –
E não estaria melhor descalça
do que com esse sapato comum
batendo o salto, rangendo,
desajeitado substituto de um anjo? –
Se ao menos o vestido fosse mais longo, esvoaçante,
e os versos saíssem não da bolsa, mas da manga,
e versassem sobre a festa, o desfile, o sino
solene,
dim dom
ab ab ba –
Mas lá no pódio já espreita uma mesinha,
meio de sessão espírita, com pés dourados,
e na mesinha esfumaça um castiçal –
De onde deduzo
que terei que ler à luz de velas
o que escrevi à luz de uma lâmpada comum
tac tac tac na máquina –
Sem me preocupar antes do tempo
se isto é poesia
e que poesia –
Se aquela na qual a prosa é malvista –
Ou aquela que é bem-vista na prosa –
E que diferença é essa,
perceptível apenas na penumbra,
sobre o fundo de uma cortina bordô
com franjas violeta?
Referência:
SZYMBORSKA, Wisława. Trema / Medo do
palco. Tradução de Regina Przybycien. In: __________. Um amor feliz. Seleção, tradução e prefácio de Regina Przybycien.
1. ed. São Paulo, SP: Companhia das Letras, 2016. Em polonês: p. 170 e 172; em
português: p. 171 e 173.
Nenhum comentário:
Postar um comentário