Transcrevo o poema a seguir tal e qual se
encontra na obra de referência, mais abaixo mencionada. E como imagino que não
há problemas no texto levado a prelo pelo poeta (1902-1987), entendo que o
termo “escapa”, na primeira estrofe, quiçá signifique “libertada”, “livre” ou
coisa que se assemelhe, inserto no terceiro verso para manter a rima com o
primeiro.
Pela ilustração da capa do livro que se
descreve, é bem possível que se tratasse de obra com narrativas de viagens
marítimas. Contudo, nem o próprio autor foi capaz de compulsá-la para saber de
seu real conteúdo: tornou-se ele “ignorante” de todo o saber humano, uma vez
que não pôde alcançá-lo a nado, ante a vastidão do oceano que – poder-se-ia
inferir – representa toda a história do homem sobre a terra.
J.A.R. – H.C.
À beira-mar
(Debbie DeWitt: pintora
norte-americana)
Romance do Ignorante
Et moi, saluant jusqu’à
terre, je sors
à reculons, pauvre
écolier de Leyde qui ai
bas et chausses percés.
(*)
(Aloysius Bertrand)
O livro ostentava na
capa
uma âncora e três
caramujos
fincados numa praia
escapa
das canções de falsos
marujos.
A água verde, ao fundo,
acendia
desejos de navegações
e um cheiro acre de
maresia
que sabia a tempo e a
Camões.
Mas o livro estava
fechado
sob o figurado oceano.
E eu não pude atingir a
nado
o texto do saber humano.
Em: “Romanceiro –
Romances d’aquém-mar”
Pequenas conchas do mar
e caracóis marinhos
entre
rosas, morangos e
lagarto
(Balthasar van der Ast:
pintor holandês)
Nota:
(*) “E eu, curvando-me até o chão, saio ao
revés, pobre colegial de Leyde que tem as meias e calças furadas”.
Referência:
PENNAFORT, Onestaldo de. Romance do ignorante.
In: __________. Poesias. Rio de Janeiro: Organização Simões, 1954.
p. 199. (Coleção “Rex”)
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