Alpes Literários

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UM PASSEIO PELOS ALPES LITERÁRIOS

sexta-feira, 18 de agosto de 2017

Sully Prudhomme - O Cisne

Para tentar manter a sonoridade, as rimas, a métrica alexandrina e a própria forma visual do original, o poeta Alberto de Oliveira vai ao máximo de sua técnica para verter ao português o poema do francês Prudhomme.

Recorre, a meu ver, excessivamente a hipérbatos, ou melhor, inversões sintáticas, para, com isso, buscar a rima perfeita, em detrimento da fluidez e inteligibilidade do texto, sendo que, por vezes, fica a impressão – claro, apenas a impressão – de que há algo equivocado na regência verbal.

Como exemplo, veja-se esta passagem: “Da neve os raros flocos brancos / Lembra o fino frouxel que lhe amacia os flancos”. Uma leitura apressada levaria o leitor a imaginar que onde se emprega “Lembra”, correto seria se empregar “Lembram”. Mas qual nada! Os dois versos contêm hipérbatos, de tal forma que a leitura direta de ambos seria: “O fino frouxel que lhe amacia os flancos lembra / os raros flocos brancos da neve”. Afinal, não são os flocos brancos da neve que lembram o frouxel da ave, mas o contrário!

J.A.R. – H.C.

Sully Prudhomme
(1839-1907)

Le Cygne

Sans bruit, sous le miroir des lacs profonds et calmes,
Le cygne chasse l’onde avec ses larges palmes,
Et glisse. Le duvet de ses flancs est pareil
À des neiges d’avril qui croulent au soleil;
Mais, ferme et d’un blanc mat, vibrant sous le zéphire,
Sa grande aile l’entraîne ainsi qu’un lent navire.
Il dresse son beau col au-dessus des roseaux,
Le plonge, le promène allongé sur les eaux,
Le courbe gracieux comme un profil d’acanthe,
Et cache son bec noir dans sa gorge éclatante.
Tantôt le long des pins, séjour d’ombre et de paix,
Il serpente, et laissant les herbages épais
Traîner derrière lui comme une chevelure,
Il va d’une tardive et languissante allure;
La grotte où le poète écoute ce qu’il sent,
Et la source qui pleure un éternel absent,
Lui plaisent: il y rôde; une feuille de saule
En silence tombée effleure son épaule;
Tantôt il pousse au large, et, loin du bois obscur,
Superbe, gouvernant du côté de l’azur,
Il choisit, pour fêter sa blancheur qu’il admire,
La place éblouissante où le soleil se mire.
Puis, quand les bords de l’eau ne se distinguent plus,
À l’heure où toute forme est un spectre confus,
Où l’horizon brunit, rayé d’un long trait rouge,
Alors que pas un jonc, pas un glaïeul ne bouge,
Que les rainettes font dans l’air serein leur bruit
Et que la luciole au clair de lune luit,
L’oiseau, dans le lac sombre, où sous lui se reflète
La splendeur d’une nuit lactée et violette,
Comme un vase d’argent parmi des diamants,
Dort, la tête sous l’aile, entre deux firmaments.

En: “Solitudes” (1869)

O Lago dos Cisnes
(Alexander Koester: pintor alemão)

O Cisne

Calmo, do espelho azul d’água profunda e calma
À face errando, os pés, lânguido, o cisne espalma
E desliza. Da neve os raros flocos brancos
Lembra o fino frouxel que lhe amacia os flancos;
Línea vela parece a asa que encurva e brande,
Esbelto, e ora retrai, ora sacode e expande;
Entre as ninféias indo, o alvo pescoço apruma,
Colhe-o após, some-o n’água, estende-o sobre a espuma,
Curva-o mole e gracioso, e ânfora antiga imita.
Dos pinheiros ao longo, onde o silêncio habita
E a paz e a sombra, vai; rastejando na esteira,
Que atrás fica, semelha intensa cabeleira
A basta ervagem fresca a palpitar. A gruta,
Que a alma atrai do poeta e a voz da tarde escuta,
Praz-lhe e a fonte que flui, que regurgita e bolha.
Vendo-as, lento se arrasta. Às vezes uma folha
Leve cai do salgueiro e, em sua queda, leve,
Roça-lhe, muda sombra, as plumas cor de neve.
Caminha agora ao largo; o implexo da ramagem
Deixa e a parte procura onde o esplendor selvagem
Diz melhor com o brilhar d’água anilada e pura.
Do lago é a parte mais azul que ele procura;
E lá vai... a cismar sobre as ondas serenas,
Entrega à luz do sol a brancura das penas.
Depois, quando, em redor, se confundem, caindo
A noite, do amplo lago as margens, e no infindo
Horizonte há somente um ponto avermelhado;
Quando tudo quedou, quando no ilimitado
Do céu paira da lua o globo enorme e albente;
Quando acende o lampiro a luz fosforescente,
E nem o menor sopro o débil junco embala:
O cisne, sob o olhar dessa noite de opala,
Em seu lago sombrio, enfim, descansa; e, acaso
Visto de alguém, assim, lembra de prata um vaso...
Põe sob a asa a cabeça, os olhos sonolentos
Fecha, e dorme, feliz, entre dois firmamentos.

Referências:

Em Francês:

PRUDHOMME, Sully. Le cygne. In: __________. Poésies: 1866-1872. Paris, FR: Alphonse Lemere (Éditeur), 1872. p. 126-127.

Em Português:

PRUDHOMME, Sully. O Cisne. Tradução de Alberto de Oliveira. In: MAGALHÃES JR., Raimundo (Ed.). Antologia de poetas franceses. Rio de Janeiro: Gráfica Tupy, 1950. p. 395-396.

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