Este poema oferece um exímio exercício de negação do que,
costumeiramente, denominamos por “espaço” – pretenso ‘locus’ capaz de fixar a
presença de alguém ou de algo em determinado sítio –, do qual, na visão do
poeta, vocábulos como “aqui” ou “alhures” são derivações imprecisas.
Melhor seria, complementa Tardieu, que “habitássemos” o tempo em sua
multiplicidade, como um vetor de inexorável orientação, cuja rota acena sempre
um adeus às figuras que assistem, indolentes, ao trânsito da noite.
J.A.R. – H.C.
Jean Tardieu
(1903-1995)
Aucun lieu
Il n’y a
aucun lieu
ici
ni ailleurs.
Ici n’existe pas.
Ailleurs n’est pas.
Nous n’avons rien
à chercher.
Attendre est vain.
Il faut habiter le
temps
multiple,
lui ressembler.
Avec lui comme lui
sans m’arrêter
je passe
disant adieu
jour après jour
aux figures
que la nuit
vertigineuse
emporte.
Ponte para lugar nenhum
(Millie Gift Smith:
pintora norte-americana)
Lugar algum
Não há
lugar algum
aqui
nem alhures.
Aqui não existe.
Alhures não é.
Nós não temos nada
a buscar.
Esperar é vão.
Preciso é habitar o
tempo
multíplice,
ser o seu símil.
Com ele como ele
sem ter parada
eu passo
dizendo adeus
dia após dia
às figuras
que a noite
vertiginosa
carrega.
Referência:
TARDIEU, Jean. Aucun lieu / Lugar
algum. Tradução de Mário Laranjeira. In: LARANJEIRA, Mário (Seleção, tradução e
introdução). Poetas de França hoje:
1945-1995. Edição bilíngue. Apresentação de Nelson Ascher. São Paulo, SP:
Edusp, 1996. p. 208.
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