Se todas as leituras de poesia são equivocadas, como advoga a poetisa,
quem sou eu para interpretar este poema de sua autoria?! Logo, apenas o
descrevo: abrindo uma página da wikipédia, alguém parte à procura do significado
do que seria uma metonímia, e lá deparou com um seu tipo particular, a
sinédoque, exemplificada por certa passagem de Jorge Luis Borges.
A pesquisa, salvo engano, era apenas para que esse alguém – o próprio
sujeito lírico – não se lançasse à aventura de interpretar um poema de modo
equivocado. Por isso, perguntou sobre como fazê-lo a um guarda, uma dessas
figuras cheias de convicção e que, talvez, jamais terá compulsado as páginas,
por exemplo, de “Interpretação e Superinterpretação”, do Umberto Eco!
Mas então chegamos à parte mais interessante: tudo se passa pelo desejo
de a poetisa redigir um poema bem contemporâneo – em outras palavras, para lá
de pós-moderno –, sem trocar fluidos com o contemporâneo (essa é boa!, como se numa
relação de amor se encontrasse!).
E a comparação final que emprega é a de um fotograma antinômico
proposital: como Roland Barthes – talvez, à altura da redação, um exemplo de
contemporaneidade –, na cama (opa, retornamos aos referentes sensuais), com os
clássicos – ora ora, longe, portanto, dos autores contemporâneos!
Será que a autora logrou sucesso em seu intento? O que dirá o internauta?
J.A.R. – H.C.
Angélica Freitas
(n. 1973)
metonímia
alguém quer saber o
que é metonímia
abre uma página da
wikipédia
depara com um trecho
de borges
em que a proa
representa o navio
a parte pelo todo se
chama sinédoque
a parte pelo todo em
minha vida
este pedaço de
tapeçaria
é representativo? não
é representativo?
eu não queria saber o
que era
metonímia, entrei na
página errada
eu queria saber como
se chegava
perguntei a um guarda
não queria fazer uma
leitura
equivocada
mas todas as leituras
de poesia
são equivocadas
queria escrever um
poema
bem contemporâneo
sem ter que trocar
fluidos
com o contemporâneo
como roland barthes
na cama
só os clássicos
Batida do Coração
(Tomasz Alen Kopera:
artista polonês)
Referência:
FREITAS, Angélica. Metonímia. In:
CALCANHOTO, Adriana (Org.). É agora como
nunca: antologia incompleta da poesia
contemporânea brasileira. 1. ed. São Paulo, SP: Companhia
das Letras, 2017. p. 29.
❁
eu amo esse poema! Angélica Freitas é maravilhosa!
ResponderExcluirPrezada Alice,
ExcluirA poesia de Angélica é, como ela bem o expressa, muito "contemporânea", captando o cotidiano de uma forma leve, conectada aos referentes da "grande" poesia, mas sem pedantismo. Decerto, uma poesia para ficar − "maravilhosa".
Um abraço,
João A. Rodrigues