Alpes Literários

Alpes Literários

Subtítulo

UM PASSEIO PELOS ALPES LITERÁRIOS

sexta-feira, 11 de agosto de 2017

Angélica Freitas - Metonímia

Se todas as leituras de poesia são equivocadas, como advoga a poetisa, quem sou eu para interpretar este poema de sua autoria?! Logo, apenas o descrevo: abrindo uma página da wikipédia, alguém parte à procura do significado do que seria uma metonímia, e lá deparou com um seu tipo particular, a sinédoque, exemplificada por certa passagem de Jorge Luis Borges.

A pesquisa, salvo engano, era apenas para que esse alguém – o próprio sujeito lírico – não se lançasse à aventura de interpretar um poema de modo equivocado. Por isso, perguntou sobre como fazê-lo a um guarda, uma dessas figuras cheias de convicção e que, talvez, jamais terá compulsado as páginas, por exemplo, de “Interpretação e Superinterpretação”, do Umberto Eco!

Mas então chegamos à parte mais interessante: tudo se passa pelo desejo de a poetisa redigir um poema bem contemporâneo – em outras palavras, para lá de pós-moderno –, sem trocar fluidos com o contemporâneo (essa é boa!, como se numa relação de amor se encontrasse!).

E a comparação final que emprega é a de um fotograma antinômico proposital: como Roland Barthes – talvez, à altura da redação, um exemplo de contemporaneidade –, na cama (opa, retornamos aos referentes sensuais), com os clássicos – ora ora, longe, portanto, dos autores contemporâneos!

Será que a autora logrou sucesso em seu intento? O que dirá o internauta?

J.A.R. – H.C.

Angélica Freitas
(n. 1973)

metonímia

alguém quer saber o que é metonímia
abre uma página da wikipédia
depara com um trecho de borges
em que a proa representa o navio
a parte pelo todo se chama sinédoque
a parte pelo todo em minha vida
este pedaço de tapeçaria
é representativo? não é representativo?
eu não queria saber o que era
metonímia, entrei na página errada
eu queria saber como se chegava
perguntei a um guarda
não queria fazer uma leitura
equivocada
mas todas as leituras de poesia
são equivocadas
queria escrever um poema
bem contemporâneo
sem ter que trocar fluidos
com o contemporâneo
como roland barthes na cama
só os clássicos

Batida do Coração
(Tomasz Alen Kopera: artista polonês)

Referência:

FREITAS, Angélica. Metonímia. In: CALCANHOTO, Adriana (Org.). É agora como nunca: antologia incompleta da poesia contemporânea brasileira. 1. ed. São Paulo, SP: Companhia das Letras, 2017. p. 29.

2 comentários:

  1. eu amo esse poema! Angélica Freitas é maravilhosa!

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Prezada Alice,
      A poesia de Angélica é, como ela bem o expressa, muito "contemporânea", captando o cotidiano de uma forma leve, conectada aos referentes da "grande" poesia, mas sem pedantismo. Decerto, uma poesia para ficar − "maravilhosa".
      Um abraço,
      João A. Rodrigues

      Excluir