O poeta sonha que a sua alma é um lago, a refletir as alegrias e
tristezas que lhe são extrínsecas, como pupila que reverbera o estado dos céus
mais acima, ou de outro modo – explicitando a metáfora –, pelo estado de
espírito das pessoas que estão à sua volta.
Mas o sujeito lírico reconhece-se “impassível e quieto”, ainda que tais
ocorrências possam atingir-lhe de um modo ou de outro. Diz isso porque, em sua
relação de amor, percebe alguma amplidão, distância, inconstância e imprecisão.
J.A.R. – H.C.
Guilherme de Almeida
(1890-1969)
Os Lagos
Amo os lagos azuis de
alvas águas tranquilas,
Entre os cílios de
junco, eles são as pupilas
da terra, olhando o
céu de gaze, olhando, no alto,
asas, astros e a
clara amplidão de cobalto...
Quando o céu se
entristece, o lago é triste; quando
o céu é alegre, o
lago alegra-se: e, espelhando
a vida azul do
espaço, e pondo luz e cores
na morna prostração
das águas incolores,
é um pedaço de céu
exilado na terra.
Mas, na órbita de
areia e de liquens, que o encerra,
no seu seio, onde
vivem seres singulares,
sob o calmo vogar dos
brancos nenúfares,
sem reflexos de céu e
arrepios de inseto,
o lago é sempre o
mesmo: impassível e quieto.
Sob o amplo céu do
amor, alto, inconstante e vago;
uma noite eu sonhei
que minha alma era um lago...
A Casa do Lago
(Leonid Afremov:
pintor israelense)
Referência:
ALMEIDA, Guilherme de. Os lagos. In:
__________. Toda a poesia. Tomo II -
Messidor. Livro de horas de sóror dolorosa: 1919-1920 - matinas e laudes. São
Paulo, SP: Livraria Martins Fontes, nov. 1952. p. 143-144.
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