O poeta brinca com coisa séria: a fome. Ela que comumente grassa em
períodos de guerra, nos quais muitos vão parar em postos de saúde adaptados e
acabam morrendo de um mal que nem diretamente se originou do conflito.
Mas é provável que o poema faça alusão a algum feito do qual tenha
decorrido prejuízo à prestação dos cuidados de saúde, na Alemanha ou em
outro lugar que se desconhece, em razão de profissionais imperitos ou neófitos
em assuntos da espécie.
J.A.R. – H.C.
Erich Kästner
(1899-1974)
Hunger ist heilbar
Es kam ein Mann ins
Krankenhaus
und erklärte, ihm sei
nicht wohl.
Da schnitten sie ihm
den Blinddarm heraus
und wuschen den Mann
mit Karbol.
Befragt, ob ihm
besser sei, rief er: “Nein.”
Sie machten ihm aber
Mut
und amputierten sein
linkes Bein
und sagten: “Nun
gehts Ihnen gut.”
Der arme Mann
hingegen litt
und füllte das Haus
mit Geschrei.
Da machten sie ihm
den Kaiserschnitt,
um nachzusehen, was
denn sei.
Sie waren Meister in
ihrem Fach
und schnitten ein
ernstes Gesicht.
Er schweig. Er war
zum Schreien zu schwach.
Doch sterben tat er
noch nicht.
Sein Blut wurde
freilich langsam knapp.
Auch litt er an
Atemnot.
Sie sägten ihm noch
drei Rippen ab.
Dann war er endlich
tot.
Der Chefarzt sah die
Leiche an.
Da fragt ein Andrer,
ein junger:
“Was fehlte denn dem
armen Mann?”
Der Chefarzt
schluchzte und murmelte dann:
“Ich glaube, er hatte
nur Hunger.”
Os famintos e a caça
(Joel Rea: pintor
inglês)
A fome é curável
O homem entrou no
hospital
e disse: “Não me
sinto bem”.
Então, extraem-lhe o
apêndice
e lavam-no com
formol.
“Sente-se melhor?”
Responde: “Não”.
Mas os médicos
dão-lhe coragem
e cortam-lhe a perna
esquerda,
garantindo: “Agora
vai ficar bom”.
Continua a sofrer, no
entanto,
e enche de gritos o
hospital.
Para descobrir o que
pode ser,
praticam-lhe uma
cesariana.
Embora doutíssimos no
ramo,
os cirurgiões fazem
caretas.
Mudo, sem forças para
gritar,
ele morrer, não morre
não.
Esvai-se-lhe pouco a
pouco o sangue,
o ar já lhe vai
faltando?
Serram-lhe três
costelas,
e finalmente expira.
O cirurgião-chefe
contempla o cadáver.
Aí pergunta-lhe um
estudante:
“Que coisa tinha esse
pobre diabo?”.
O doutor, engasgado,
murmura:
“Acho que era apenas
fome”.
Referência:
KÄSTNER, Erich. Hunger ist heilbar / A
fome é curável. Tradução de Carlos Drummond de Andrade. In: ANDRADE, Carlos
Drummond de. Poesia traduzida.
Organização e notas de Augusto Massi e Júlio Castañon Guimarães. Introdução de
Júlio Castañon Guimarães. São Paulo, SP: Cosac Naify, 2011. Em alemão: p. 194 e
196; em português: p. 195 e 197. (Coleção “Ás de colete”; 20)
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