Com linguagem espontânea, meio casual,
incidente sobre as peculiaridades e as circunstâncias da vida, Szymborska sabe
extrair dali o pó entesourado, mesmo que tudo esteja envolto em confusão ou
desordem: “Herdamos a esperança – o dom de esquecer. Você vai ver como
damos à luz em meio a ruínas”.
Trata-se de uma expedição simbólica ao
Himalaia, não acontecida de fato, mas metaforizada pelos embates que nos levam
a fazer um esforço de superação dos estados opressivos pelos quais passamos,
matéria de informe a um presumível ouvinte não-humano, nesta que é, sem dúvida,
uma criação hipotética, alternativa, cheia de imaginação, forma ideal empregada
pela poetisa para destilar o seu talento e ironia.
J.A.R. – H.C.
Wisława Szymborska
(1923-2012)
Z nieodbytej wyprawy
w Himalaje
Aha, więc to są Himalaje.
Góry w biegu jak księżyc.
Chwila startu
utrwalona
na rozprutym nagle
niebie.
Pustynia chmur
przebita.
Uderzenie w nic.
Echo – biała niemowa.
Cisza.
Yeti, niżej jest środa,
abecadło, chleb
i dwa a dwa to
cztery,
i topnieje śnieg.
Jest czerwone
jabłuszko
przekrojone na krzyż.
Yeti, nie tylko
zbrodnie
są u nas możliwe.
Yeti, nie wszystkie
słowa
skazują na śmierć.
Dziedziczymy nadzieję –
dar zapominania.
Zobaczysz, jak
rodzimy
dzieci na ruinach.
Yeti, Szekspira mamy.
Yeti, na skrzypcach
gramy.
Yeti, o zmroku
zapalamy światło.
Tu – ni księżyc, ni ziemia
i łzy zamarzają.
O Yeti Półtwardowski
zastanów się, wróć!
Tak w czterech ścianach lawin
wołam do Yeti
przytupując dla rozgrzewki
na śniegu
wiecznym.
Jornada ao Himalaia
(Karma Loday: artista
do Butão)
De uma expedição não
realizada ao Himalaia
Ah, então este é o
Himalaia.
Montanhas correndo
para a lua.
O instante da largada
fixado
no rasgar súbito do
céu.
Deserto de nuvens
perfurado.
Um golpe no nada.
Eco – uma branca
mudez.
Silêncio.
Yeti, lá embaixo é
quarta-feira
tem abecedário, pão
e dois e dois são
quatro
e a neve derrete.
Tem rosa amarela,
tão formosa, tão
bela.
Yeti, nem só crimes
acontecem entre nós.
Yeti, nem todas as
palavras
condenam à morte.
Herdamos a esperança
–
o dom de esquecer.
Você vai ver como
damos
à luz em meio a
ruínas.
Yeti, temos
Shakespeare lá,
Yeti, e violinos para
tocar.
Yeti, ao cair a noite
acendemos a luz.
Aqui – nem lua nem
terra
e a lágrima congela.
Ó Yeti meio lunar
pense, volte!
Entre as quatro
paredes da avalanche
assim eu chamava pelo
Yeti
batendo os pés para
me aquecer
na neve
na eterna.
Referência:
SZYMBORSKA, Wisława. De uma expedição
não realizada ao Himalaia. Tradução de Regina Przybycien. In: __________. Um
amor feliz. Seleção, tradução e prefácio de Regina Przybycien. 1. ed.
Edição bilíngue. São Paulo, SP: Companhia das Letras, 2016. Em polonês: p. 54 e
56; em português: p. 55 e 57.
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