Alpes Literários

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UM PASSEIO PELOS ALPES LITERÁRIOS

domingo, 16 de julho de 2017

Federico García Lorca - Aurora

Gullar verte livremente ao português o poema de Lorca, com dois raros sinais de pontuação, sumariando-o em suas principais ideias, sem receio de dilapidá-lo, de forma a atribuir-lhe certa uniformidade gráfica, ali onde a irregularidade da métrica dos versos é a tônica.

Mais presa ao original, a tradução de William Agel de Melo – que renunciamos a apresentá-la aqui, mas que pode ser apreciada em (LORCA, 1989, p. 451 e 453) –, por outro lado, permite visualizar de plano o olhar hiperbólico do autor espanhol sobre o alvorecer da “capital do mundo”.

E ainda que em plena “capital do mundo”, o que o poeta constata na urbe é a desolação e a ausência de esperança em seus habitantes, desumanizados pela escuridão, pelo barulho, pela ganância e pela insônia, como se saídos fossem de “um naufrágio de sangue”.

J.A.R. – H.C.

Federico García Lorca
(1898-1936)

La Aurora

La aurora de Nueva York tiene
cuatro columnas de cieno
y um huracán de negras palomas
que chapotean las aguas podridas.

La aurora de Nueva York gime
por lãs inmensas escaleras
buscando entre las aristas
nardos de angustia dibujada.

La aurora llega y nadie la recibe em su boca
porque allí no hay mañana ni esperanza posible.
A veces las moneda sen enjambres furiosos
taladran y devoran abandonados niños.

Los primeros que salen comprenden com sus huesos
que no habrá paraíso ni amores deshojados;
saben que van al cieno de números y leyes,
a los juegos sin arte, a sudores sin fruto.

La luz es sepultada por cadenas y ruidos
em impúdico reto de ciência sin raíces.
Por los Barrios hay gentes que vacilan insomnes
como recién salidas de um naufragio de sangre.

Central Park - New York
(Leonid Afremov: artista israelense)

Aurora

A aurora de New York tem
quatro colunas de lodo
e um furacão de pombas
que explode as águas podres

A aurora de New York geme
nas vastas escadarias
a buscar entre as arestas
angústias indefinidas

A aurora chega e ninguém
em sua boca a recebe
porque ali a esperança
nem a manhã são possíveis
e as moedas como enxames
devoram recém-nascidos

Os que primeiro se erguem
em seus ossos adivinham:
não haverá paraíso
nem amores desfolhados
só números, leis e o lodo
de tanto esforço baldado

A barulheira das ruas
sepulta a luz na cidade
E as pessoas pelos bairros
vão cambaleando insones
como se houvessem saído
de um naufrágio de sangue

Referências:

Em Espanhol

LORCA, Federico García. La aurora. In: __________. Obra poética completa.Tradução de William Agel de Melo. Edição bilíngue. Brasília, DF: Ed. da UnB; São Paulo, SP: Livraria Martins Fontes Editora Ltda., 1989.p.450 e 452.

Em Português

LORCA, Federico García. Aurora. Tradução de Ferreira Gullar. In: GULLAR, Ferreira (Org.). O prazer do poema: uma antologia pessoal. Rio de Janeiro, RJ: Edições de Janeiro, 2014. p. 254-255.

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