Em busca do original em francês deste poema, vertido ao português pelo
poeta brasileiro Raimundo Correia, não logrei êxito, mesmo empreendendo
consulta em diversas fontes livrescas e documentais, ou mesmo na galáxia da
internet.
Pode ser, presumo, que Raimundo Correia tenha condensado, em um texto à
parte, imagens, ideias, sentimentos, emoções e pensamentos que povoam as
páginas cheias de vocativos e metáforas do autor francês.
Seja como for, ocorrendo ou não tal hipótese, o resultado final é exuberante.
E exuberante tanto no vocabulário plástico e inusitado, quanto no primor do
arranjo das rimas e do ritmo equilibrado dos versos decassílabos. O que pensa,
você, internauta?!
J.A.R. – H.C.
(1802-1885)
Deus sonha
O dia acorda! Deus
por uma fresta
Das nuvens a
espreitar, ri-se. A floresta,
O campo, o inseto, o
ninho sussurrante,
A aldeia, o sol que
tinge a serrania...
Tudo isso acorda,
quando acorda o dia
No fresco banho de
ouro do Levante.
Deus sonha! Vaza os
olhos d’água; pica
As artérias da terra;
o lis fabrica;
E da matéria sonda o
fundo ovário;
Pinta as rosas de
branco e de vermelho,
E faz das asas vis do
escaravelho
A surpresa do mundo
planetário.
Homens! As férreas
naus de velas largas,
Monstros revéis,
formidolosas cargas
Do bruto oceano
arfando às insolências;
Extenuados os ventos,
e nos flancos
Longo enxame a
arrastar de flocos brancos
De escuma, e raios e
fosforescências...
Os estandartes de
arrogantes pregas,
As batalhas, os
choques, as refregas;
Náuseas de fogo de
canhões sangrentos;
Feroz carnificina de
ferozes
Batalhões – bando negro de albatrozes
De asa espalmada e
aberta aos quatro ventos...
Comburentes,
flamívomas bombardas,
Ígnea selva de canos
de espingardas,
Estampidos,
estrépitos, clangores,
E, bêbado de pólvora e
fumaça,
Napoleão, que, galopando, passa,
Ao ruflar de
frenéticos tambores;
A guerra, o saque, as
convulsões, o espanto;
Sebastopol em chamas; de Lepanto
O vau de lanças e
clarins repleto...
Homens! Tudo isso,
enquanto recolhido
Deus sonha, passa e
soa-lhe ao ouvido,
Como o rumor das asas
de um inseto!
(Fevereiro, 1883)
A Batalha de Sebastopol:
seção central do
tríptico
(Jean-Charles
Langlois: pintor francês)
Referência:
HUGO, Victor. Deus sonha. In: MILLIET, Sérgio (Seleção e Notas). Tradução de Raimundo Correia. Obras-primas da poesia universal. 3.
ed. São Paulo, SP: Livraria Martins Editora, 1957. p. 42-43.
❁
Bom dia
ResponderExcluirSaúde e paz
https://www.lecoindesmots.com/le-poeme_ecrit-sur-le-tombeau_victor-hugo_1967.html
Prezado(a): igualmente para você. J. A. Rodrigues
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