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UM PASSEIO PELOS ALPES LITERÁRIOS

sábado, 3 de junho de 2017

Moacir de Almeida - Cavalgada das Valquírias ‎

Este belo poema do poeta em epígrafe – note-se, de vida curta, eis que faleceu aos 23 anos, de uma hipertrofia cardíaca – é todo voltado à representação de passagens imortalizadas na ópera “A Valquíria”, de Richard Wagner, uma das que compõem a tetralogia “O Anel de Nibelungo”.

Percebe-se a ênfase que Almeida atribui ao ressurgimento da lenda nórdica das amazonas no trabalho de recriação artística do compositor alemão, lenda que, a bem dizer, também se encerra nos grandes veios da cultura dos povos germânicos. 

Cavalgada das Valquírias
(Richard Wagner)

J.A.R. – H.C.

Moacir de Almeida
(1901-1924)

Cavalgada das Valquírias(1)

Ouve-se o resfolgar das Valquírias radiosas,
Soluçando através das músicas violentas;
E arrojam-se os corcéis nas nuvens procelosas,
Acordando os trovões e arrastando as tormentas.

As Valquírias! Há um luar de seios e de braços
Passando em turbilhões de lírios... Há um clamor
Nas montanhas... É o sol que atravessa os espaços,
Amortalhando o céu no manto abrasador.

E elas voam, soltando as louras cabeleiras
Nas músicas, prendendo as notas nos cabelos...
E os cascos dos corcéis abrem nas cordilheiras
Renos (2) de estrelas, entre as pedras e entre os gelos.

Da boca dos clarins, das cordas dos violinos,
Elas surgem, revoando e constelando o azul:
São tantas que, nos céus, os seus vultos divinos
Cobrem o espaço como os galhos da Ermensul.(3)

As Valquírias! Lá vão, entre dilúvios de astros,
Com os gládios a escorrer de raios fulminantes.
E as águias brancas, no ar, vão-lhe seguindo os rastros,
Abrindo à aurora roxa as asas coruscantes.

E os deuses do Valhala(4) elevam-se, clamando.
Tor(5) fulgura: – “Quem ousa acordar o trovão?”
– “Nós já morremos” – brame Odin(6) no azul nefando.
(E uivam, brancos de luz, os lobos da amplidão.)

“Quem vos ressuscitou, fantasmas de harmonia,
– carne de luz e som, no turbilhão superno?(7)
Que braço vos arrasta à vastidão sombria?
Que mão vos arrancou do crepúsculo eterno?”

E elas rugem, correndo em seus corcéis de bruma:
– “Viemos do coração de Wagner...” E os clarões
Dos seus corpos de som abrem os astros, numa
Via-Láctea infernal de gládios e visões...

Cavalgada das Valquírias
(William T. Maud: pintor britânico)

Elucidário:

(1) Na mitologia nórdica, as Valquírias eram amazonas montadas em corcéis que tinham por missão transportar as almas dos guerreiros mortos nas batalhas para o Palácio de Odin (Valhala);
(2) Flexão sobre a palavra Reno, o rio que corta vários países da Europa, entre eles a Alemanha;
(3) Símbolo religioso dos pagãos saxônicos da Westfália, representado por um carvalho ou por pilares de madeira;
(4) Palácio onde as almas dos guerreiros mortos em combate eram recebidas para servir ao deus Odin;
(5) Tor ou Thor, filho de Odin, é a divindade nórdica pagã que rege os trovões e as batalhas;
(6) Deus principal do clã dos deuses Asses (Æsir), o mais importante entre os da mitologia nórdica;
(7) Que tem poder absoluto, supremo.

Referência:

ALMEIDA, Moacir de. Cavalgada das Valquírias. In: __________. Gritos bárbaros. Rio de Janeiro: Benjamim Costallat & Miccolis Editores, 1925. p. 114-115.

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