Como poeta português nascido na África
do Sul e radicado, por longo tempo, em Londres – onde foi professor de Literatura
Portuguesa no King’s College –, Macedo acaba por sentir certo alheamento em
relação àquilo que o circunda, quando distante se encontra dos influxos de uma
pátria com a qual, males dos males, parece não se identificar.
Mas percebe que dá proveito a uma vida
nova, à fecundação de um corpo, a cada vez que retém as águas que delimitam o
que quer que seja uma pátria: sem elas, a solidão lhe assola e reconhece-se
como não mais que um afluente seco de um lago deteriorado.
J.A.R. – H.C.
Hélder Macedo
(n. 1935)
Sem Outra Pátria
Não por amor nem por
dever
me obrigo
mas pela germinal
fúria obscura
de só querer-me igual
à vida construída à
imagem que não sou
e não serei.
Cada vida é um corpo
a fecundar
como uma pátria,
um lago bloqueado
que em suas margens
faz prever
o rio
e o seu mar.
Sem outra pátria
perto me construo
ausente
e me reúno no perdido
influxo
onde me encontro só
um rio seco
do lago apodrecido.
(De: Poesia
1957-1977, 1979)
Kerhorl, a Baía, Estuário
do Rio Landerneau
(Eugène Boudin:
pintor francês)
Referência:
MACEDO,
Hélder. Sem outra pátria. In: MOURÃO-FERREIRA, David; SEIXO, Maria Alzira
(Orgs.). Portugal: a terra e o homem. II Volume - 3ª Série. Lisboa, PT: Fundação Calouste
Gulbenkian, 1981. p. 32.
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