Uma forma de expressão alusiva, sem
tanger imoderadamente os nomes próprios empregados durante a estação – já bastante
desgastados por sua recorrência –, mas tão nitidamente natalina, ao contemplar a
gênese primordial e as sequentes recriações induzidas pelo passar dos anos.
Assim apreciei o desenrolar e a beleza
do poema abaixo, de autoria da poetisa portuguesa em epígrafe, recolhido à
coletânea “Carne del Cielo” (“Carne do Céu”) – editada por Alfredo Pérez
Alencart, poeta e ensaísta peruano-espanhol, e Luis Cruz-Villalobos, poeta e
editor chileno –, e traduzido pelo primeiro ao espanhol.
Quanto ao original do poema de Barroso,
encontrei-o no endereço eletrônico “O Banquete Poético”,
aparentemente mantido pelo padre mineiro Antônio Damásio Rêgo Filho (digo “aparentemente”
porque ali não há qualquer menção ao seu mantenedor), segundo algumas
diligências que levei a curso na internet.
J.A.R. – H.C.
Maria do Sameiro Barroso
(n. 1951)
Poema de Natal
Os pensamentos galgam
as montanhas, a escuridão
e o silêncio.
Nas mãos, sulcadas de
violetas e de pássaros, há navios
e espuma que se
afastam,
cavalos, liras e
grinaldas que seguem a lua branca
de montanhas e de
renas.
No húmus fecundo da
terra,
as horas tornam-se
antigas, celebrando as mãos,
o inverno, o
solstício
entre harpas
marinhas, corolas, cristais, leitos de giestas.
Um cântico de Natal
ecoa.
O sangue negro das
florestas desdobra a flor do âmbar,
os olhos abertos para
a vida resumem o espaço,
possibilidade,
respiração,
raiz secreta que se
abre ao esplendor dos astros fulvos,
as mãos dando para o
Eterno,
o céu e a púrpura
espelhando as lareiras e o sol,
no seu fulgor de
palavras inexactas, música primordial,
estendida na noite
que se desprende dos
seus tálamos de estrelas.
Véspera de Natal
(Thomas Kinkade:
pintor norte-americano)
Poema de Navidad
Los pensamientos
saltan las montañas, la oscuridad
y el silencio.
En las manos,
surcadas de violetas y de pájaros, hay barcos
y espumas que se
alejan,
caballos, liras y
guirnaldas que siguen la luna blanca
de montañas y de
renos.
En el humus fecundo
de la tierra,
las horas se vuelven
antiguas, celebrando las manos,
el invierno, el
solsticio
en arpas marinas,
corolas, cristales, lechos de retamas.
Un cántico de Navidad
resuena.
La negra sangre de
los bosques despliega la flor del ámbar,
los ojos abiertos a
la vida resumen el lugar,
posibilidad,
respiración,
raíz secreta que se
abre al esplendor de los astros pajizos,
las manos hacia lo
Eterno,
el cielo y la púrpura
espejeando en las laderas y el sol,
en su fulgor de
palabras inconexas, música primordial
expandida en la noche
que se desprende de
sus tálamos de estrellas.
Referências:
Em Português
BARROSO, Maria do Sameiro. Poema de Natal. Disponível neste endereço.
Acesso em: 7 dez. 2016.
Em Espanhol
BARROSO, Maria do Sameiro. Poema de
Navidad. Traducción de A. P. Alencart. In: ALENCART, A. P.; CRUZ-VILLALOBOS,
Luis (Eds.). Carne del cielo: versos
de navidad. Antología de poetas iberoamericanos de hoy. Pinturas de Miguel
Elías. Santiago, CL: Hebel Ediciones, 2015. p. 84-85. Disponível neste endereço.
Obrigada pela sua sensibilidade e pela justeza da sua apreciação.
ResponderExcluirMaria do Sameiro Barroso
Prezada Maria,
ResponderExcluirDe fato, sou eu a muito agradecer pelo poema, essa forma de criação que nos faz capazes de vislumbrar outras tantas realidades, conexões, possibilidades de interpretação para os diversos fatos da vida, a própria literatura aí inclusa.
Afinal, ser poeta/poetisa – permita-me a digressão – é como ter o dom da hermenêutica para decifrar os sinais que aos olhos assomam...
Um grande abraço,
J. A. Rodrigues